Na noite de sexta, 6, moradores do Santo Agostinho perderam o sono diante de uma movimentação atípica nos morros Caviana e Conquista – dominados pelo Comando Vermelho (CV). Por volta das 20, o terror tomou conta de todos pelo som de dezenas de tiros que cortavam o céu escuro. Ninguém sabia de onde saíam as balas, mas a maioria tem certeza de uma coisa: os bandidos da Vila Brasília e Vale Verde – do Terceiro Comando Puro (TCP) – queriam tomar o Santo Agostinho, bairro que movimenta cerca de R$ 400 mil por semana só em drogas.
Conforme o aQui apurou, os traficantes do TCP sonham com o milionário ponto de venda de drogas do Santo Agostinho e, por isso, entraram em guerra com o CV. Segundo informações de fontes, a gangue reuniu ‘um bonde’ e subiu a Caviana na sexta. “Chegando na boca, desceram o aço, deixando, ao menos, 10 feridos”, resumiu uma delas. “Na sequência, traficantes do Padre Jósimo e Santa Cruz se reuniram em um bonde para ‘baquear’ a comunidade do TCP, na Vila Brasília, como vingança à invasão da Caviana”, completou.
O TCP da Vila Brasília é dominado por um tal de Bicheiro, que seria chefão de várias bocas espalhadas pelo estado do Rio de Janeiro, inclusive em Angra dos Reis e Barra Mansa. “Ele quer dominar geral e por isso veio na intenção de ‘baquear’ a Conquista na sexta-feira”, contou outra fonte.
O pesadelo, que resultou na morte de Lucas Barbosa Guedes, 22, alvejado durante troca de tiros entre os bandidos, foi só o começo. Na segunda, 9, os moradores tentavam se proteger. “Fala para teu filho e sua mãe não saírem de casa. O Santo Agostinho, Vila Americana e Vila Brasília vão entrar em guerra”, dizia a mensagem no WhatsApp de uma moradora do Morro da Conquista, que desabafou com o aQui: “Estamos reféns”.
Em busca de informação e proteção, os moradores trataram de fazer um grupo no WhatsApp. De cinco em cinco minutos, notícias de toda ordem brotavam incansavelmente. As reais se confundiam com fake news e ambas se misturavam com orações desesperadas de evangélicos fundamentalistas. As mensagens davam conta de novos tiroteios, mais mortes, e até um toque de recolher. “De acordo com alguns, toque de recolher às 17 horas. Motoqueiros têm que subir sem capacete. Santo Agostinho todo”, dizia uma das mensagens que viralizou na periferia da cidade do aço em questão de segundos.
Não foi possível confirmar a veracidade de todas as informações que pipocaram, pois, dentre as leis existentes, apenas a do silêncio é respeitada no morro. Mesmo assim, as notícias desencontradas pipocavam a todo instante. Um áudio de uma pessoa, não identificada, garantia que o Comando Vermelho teria arregimentado reforços na capital, suficientes a ponto de encher um ônibus. “O papo que rola, mané, é que chegou um ônibus lá na Conquista, mané. Cheio de vagabundo do Rio, do Comando Vermelho. Cada um com um bico (gíria de traficante que significa fuzil, grifo nosso), papo que rola é que chegou um ‘bondão’ aí. Vai invadir tudo aí. Atividade, hein”, avisava o desconhecido.
As notícias aterrorizaram o comércio e escolas. Funcionários do Jayme Martins, localizada no pé do Morro da Conquista, disseram que ficaram com medo de ir trabalhar. “Meu plantão foi na segunda-feira, justamente dois dias depois do ocorrido. Recebi várias informações de que tinha gente atirando e rondando as ruas. Fiquei com medo de ir trabalhar. Não era um lugar seguro. Pensamos que, se houvesse outro tiroteio, poderiam invadir a escola para se esconder ou coisa do tipo”, contou a funcionária, aterrorizada.
Em nota, a PM confirmou que havia disputa territorial entre traficantes e que esteve no Morro da Conquista. “Após confronto entre facções rivais na data de ontem, aos traficantes da facção do Comando Vermelho no Bairro Santo Agostinho e Morro da Conquista, equipes intensificaram o patrulhamento no local para garantir a ordem e o sossego da população. Após cerco no local já conhecido como ponto de vendas de drogas, foram vistos alguns elementos e com a aproximação das guarnições os mesmos empreenderam fuga, mas equipes lograram êxito em alcançar um dos elementos”, diz a nota da PM.