quarta-feira, maio 1, 2024

Tem, mas não tem

Mais um mistério a ser desvendado nos corredores do Palácio 17 de Julho. Onde foram parar 44 leitos hospitalares que o governo Samuca jura ter deixado montados, prontos para serem usados, no antigo Hospital Santa Margarida, e que o governo Neto jura de pés juntos que nunca viu, nem onde foram parar. A mais nova polêmica envolvendo Samuca e Neto foi apresentada ao aQui há mais de um mês por uma fonte que pede anonimato. Segundo ela, os leitos teriam sido deixados no quarto andar do hospital, que Samuca comprou e que Neto está transformando em centro administrativo. Detalhe importante: os 44 leitos estariam completamente equipados. Teriam até instalações para gases medicinais e um gerador teria sido instalado para manter os equipamentos funcionando.
“O 4o andar do Hospital Santa Margarida foi preparado para tratamento da Covid-19. Instalaram 44 leitos, todos equipados com camas novas, colchões novos, roupa de cama, inclusive todo o sistema de fornecimento de oxigênio, ar e vácuo. Tudo completo. Havia ainda uma central de abastecimento no térreo do prédio com todas as tubulações em cobre até os leitos para o abastecimento necessário dos gases medicinais. O centro de abastecimento (externo) contava com um tanque master, um compressor e um equipamento a vácuo. A rede elétrica estava pronta até a subestação”, detalhou a fonte, mostrando, pelos termos técnicos, que sabe do que fala. “Existiam respiradores, que foram disponibilizados para as outras unidades da rede, talvez mais algum equipamento, que desconheço, de uso para o paciente, e a ligação da subestação, que dependia da chegada dos cabos de energia”, acrescentou.
A fonte aproveitou para contar ao aQui que faltava um pequeno “detalhe” para que todos os 44 leitos do Hospital Santa Margarida pudessem ser usados na hora que o prefeito quisesse. “Era a instalação dos cabos de energia para levar a eletricidade da caixa de distribuição, no térreo, para o 4o andar”, disse, para logo completar: “A gestão passada (Samuca) investiu para que nada faltasse no aten-dimento específico à Covid”, disparou, aproveitando para encaminhar ao jornal várias fotos e um vídeo que foi publicado nas redes sociais do ex-prefeito em 10 de junho de 2020, logo após Samuca ter visitado as instalações do Santa Margarida. O vídeo mostra claramente os leitos equipados no 4º andar, pelo menos na época da filmagem.
Tem mais. A fonte destaca que em relação ao gerador do Santa Margarida, ‘peça fundamental em um hospital’, ela também estava em perfeitas condições. “A subestação estava pronta, do poste da rua até a caixa blindada (serviço da Light); da caixa blindada até aos transformadores (2); e dos transformadores para as caixas de distribuição. O gerador estava ligado a uma caixa específica, funcio-nando perfeitamente. O que faltava era a chegada dos cabos que sairiam das caixas de distribuição para os respectivos andares”, reiterou.
‘Nada disso’
Procurada pelo aQui, a prefeitura de Volta Redonda afirmou, por meio da secretaria de Comunicação Social (Secom) que, quando Neto assumiu o governo, não havia nenhum equipamento no antigo Hospital Santa Margarida. “Não encontramos nada disso”, ressalta a nota. Questionada se os equipamentos estariam em outro lugar e se poderiam ter sido usados para, por exemplo, equipar o anexo da FOA no Hospital do Retiro, a Secom insistiu na tese de que não havia equipamentos – ou se havia, eles teriam sumido. “Se essa rede existisse de verdade, seria uma excelente notícia”, comparou a Secom de forma sarcástica.
E foi além. Afirmou que o Hospital Santa Margarida – arrematado em leilão judicial pela gestão Samuca em 2017, por R$ 11 milhões, e que nunca recebeu um paciente até ontem, sexta, 21 de maio de 2021 – não teria “condições mínimas para receber pacientes”. No entanto, o governo municipal não enumerou quais seriam as condições para que a unidade voltasse a atender o público. Preferiu justificar o uso da unidade hospitalar, um prédio com nove andares, para abrigar setores administrativos da secretaria de Saúde, como uma espécie de mal necessário. “É o que se pode fazer com a estrutura encontrada”, ponderou.
Com relação ao Hospital de Campanha, montado no Raulino de Oliveira, e ao Hospital do Idoso, instalado no prédio da antiga Clínica São Camilo, para atendimento a pacientes de Covid-19, o governo Neto explicou que nada podia fazer quando assumiu a prefeitura de Volta Redonda. “Foram desmobilizados (hospitais) antes do atual governo assumir e a estratégia de aluguel (da tenda e do prédio, respectivamente) se mostrou cara e ineficiente no médio e longo prazo. Além disso, há investigações em curso para apurar suspeitas de corrupção no Hospital de Campanha e incontáveis ações judiciais sobre os aluguéis do Hospital do Idoso”, ressaltou a Secom.
‘Nada foi retirado’
Procurado pelo aQui para desfazer o mistério dos 44 leitos que sumiram como em um passe de mágica, o ex-prefeito Samuca Silva garantiu, a contragosto, que os leitos estavam no Santa Margarida quando ele deixou o Palácio 17 de Julho. O engraçado é que, em sua resposta, o ex-prefeito mostrou manter a sua empáfia do tempo que comandava o Palácio 17 de Julho, deixando claro que acreditava que sua posição na reportagem seria distorcida. “Apesar de acreditar que irá (ser publicado) de forma totalmente diferente, distorcida, do que vou escrever, lá vai”, disse, respondendo à pergunta se os 44 leitos do Hospital Santa Margarida estariam prontos para funcionar, atendendo pacientes de Covid-19, e se algum paciente chegou a ser internado.
Veja a resposta (na íntegra) que Samuca escreveu ao aQui: “Ao contrário do que o jornal afirma, NUNCA foram prometidos ou colocados na programação para COVID justamente porque estariam vinculados a questão administrativa, correndo risco aos servidores. Os leitos estavam planejados e seriam usados para RETAGUARDA da rede e segundo informação da secretaria de saúde a época os procedimentos foram efetuados como rede de gases, energia elétrica etc. Pacientes não foram transferidos por questões operacionais e financeiras”, afirmou o ex-prefeito, sem detalhar quais seriam essas questões.
Para a segunda pergunta que lhe foi feita – para onde os equipamentos teriam sido levados e por que a mudança? – Samuca foi curto e grosso. Veja a resposta, também na íntegra, para que ele não reclame ao ler esta reportagem: “Nada foi retirado, todos os equipamentos permaneceram lá”, garantiu.
Ao ser questionado sobre o valor da estrutura montada no Hospital Santa Margarida para receber ninguém, Samuca jogou a bomba no colo da então secretária de Saúde, a enfermeira Flávia Lipke. “Muito específico. Na realidade, a parte técnica que deveria responder, a secretária que gerenciava isto tudo”, disse.
O detalhe é que Flávia assumiu o cargo – no lugar de Alfredo Peixoto, braço direito de Samuca – no dia 5 de junho, menos de uma semana antes de o prefeito fazer o vídeo ao vivo nas redes sociais apresentando os leitos no Santa Margarida, em 10 de junho. Se ela foi mesmo a responsável por tudo, é um exemplo de eficiência. Deveria ter sido contratada antes.

Governo Neto afirma que montou leitos suficientes ‘para abrir um hospital’

Se os 44 leitos do Santa Margarida sumiram ou não, isso não parece afetar a estratégia (ou a falta dela) do governo Neto no combate à Covid-19. Em um material divulgado para a imprensa e no endereço eletrônico da prefeitura de Volta Redonda, a administração municipal afirma que Neto já teria equipado leitos suficientes “para abrir um hospital”. “Foram 12 leitos de UTI, 46 de Clínica Médica e quatro de Unidade Intermediária. Todos devidamente equipados e atendendo a população”, afirma o release, garantindo que o total de leitos – abertos no Hospital do Retiro entre janeiro e o início de abril, além de outros dois no Hospital São João Batista no mesmo período – seria superior ao que existe de vagas em hospitais na maioria das cidades do país. “Na verdade, pela realidade nacional, é mais do que a maioria dos municípios brasileiros têm a oferecer”, gabou-se o governo.
A prefeitura de Volta Redonda destacou ainda que, segundo dados do Conselho Federal de Medicina (CFM), somente 532 dos cinco 5.570 municípios brasileiros oferecem a mesma quantidade de leitos de UTI que são ofertados na cidade do aço. “Segundo o CFM, se considerados apenas os leitos de medicina intensiva da rede pública, apenas 466 destas cidades oferecem tratamento em UTI no país”, comparou. Há controvérsias.

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