A troca de comando da Guarda Municipal de Volta Redonda, realizada no final de junho, na sede da corporação, na Ilha São João, se desenrolou envolta em pompas e circunstâncias. Sob o clima ameno da manhã de sexta, 28 – apenas com o aQui representando a imprensa, vale frisar –, representantes das três forças de segurança testemunharam a saída de Paulo Dalboni e a ascensão do GM de carreira Deles-sandro de Assis. O evento contou ainda com a participação do prefeito Samuca Silva como hasteador da bandeira do Brasil durante a execução do Hino Nacional. Não há registros na história recente do município de uma substituição de comandantes tão gla-mourizada como esta.
Após receber as insígnias de comandante, o que joga literalmente em seus ombros a responsabilidade pela chefia da corporação, Dalessandro discursou para sua tropa e, ao falar de sua falecida mãe que o aconselhava em momentos difíceis, se emocionou. “O prefeito viu uma necessidade de oxigenação. Durante esse tempo que estou na Guarda, deu para adquirir experiência. Todo mundo tem algo a ensinar e a aprender. Aprendi muito com quem esteve e está aqui, e pretendo deixar um pouquinho da minha contribuição também. Integração entre as forças, cada um fazendo seu papel. Quando me encontrava numa situação difícil, complicada, minha mãe sempre esteve junto comigo, me ajudando a superar. Hoje, neste momento de intensa felicidade, também me lembro dela”, discursou Dalessandro, que acumula 11 anos como GM e mais dois anos e meio como coordenador-adjunto do Ciosp (Centro Integrado de Operações de Segurança Pública).
Adotando um discurso simplório, o (primeiro) secretário de Segurança Pública do município, coronel PM Antônio Goulart Matos, elogiou a atuação da Guarda, frisando os avanços para a corporação. “A GM conta com novas viaturas e uniformes, além de uma proposta de Plano de Carreira, inexistente até então. Além disso, foi uma vitória a liberação do porte de armas para os guardas”, avaliou Goulart, se esforçando para encontrar palavras e motivos para elogiar a atuação do ex-comandante, que esteve com a cabeça a prêmio desde que gravou um vídeo polêmico onde chamou para a briga aqueles que considerou “vagabundos que não seguem as leis”. “Dalboni fez um trabalho excelente, colaborando com as forças de segurança em prol da segurança dos cidadãos de Volta Redonda”, pontuou.
Para o leitor ter uma ideia, vale refrescar a memória. Em pouco mais de 1 minuto e 49 segundos, Dalboni desafiou a bandidagem em um recado inflamado, conferindo, por conta própria, à GM de todo o Brasil o status de polícia. “Para você aí, vagabundo que não gosta de seguir a lei e por várias vezes você não foi atrás de ser uma pessoa digna, vai um recado do comandante e de todas as guardas do Brasil: a Guarda é polícia, queira você ou não queira. Nós seguimos as leis. Nós temos as leis comigo… conosco. As leis é (sic) para serem seguidas. Então que fique a dica aí: Guarda Municipal, Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal – nós estamos unidos para transformar esse país numa grande nação. Uma nação em que você seja livre, mas que respeite o outro e respeite as coisas das outras pessoas”, disse na época.
Tem mais. Dalboni avisou que ao bater de frente com a GM, o meliante teria de arcar com as consequências. “Fica a dica. Não bata de frente com a Guarda Municipal, porque se você bater de frente com a Guarda Municipal de Volta Redonda, o azar é certo. Um grande abraço a todo mundo”, finalizou o ex-comandante que, como resposta por ter desafiado o crime organizado local, virou assessor de coisa alguma dentro do governo Samuca. Ou, oficialmente, assessor especial da secretaria de Segurança Pública.
Se a fala do ex-comandante fez o leitor se lembrar do polêmico Luiz Henrique Monteiro Barbosa, o todo-poderoso comandante da GM durante o governo Neto, não se sinta sozinho. Assim como Luiz Henrique deu ao ex-prefeito alegrias, mas, também, muita dor de cabeça por conta de seu comportamento e falas arbitrários, virulentos e polêmicos, Dalboni também desempenhou bem esse papel.
O curioso é que em seu discurso de despedida, Dalboni manteve silêncio sobre seu vídeo. Não disse nada, inclusive, sobre seu estado de saúde, que foi a desculpa dada por ele horas depois de gravar o vídeo polêmico para explicar sua exacerbação. Apenas se despediu, agradecendo o apoio de Samuca. “Foi muito bom o período na Guarda, avançamos bastante. O prefeito Samuca deu total apoio à corporação, e lá na secretaria é um novo desafio. Vamos tentar fazer de tudo para que a gente afirme essa condição, consolide todo esse processo e se ajuste com as outras forças de segurança”, disse, ‘esquecendo-se’ de abordar que não tinha mais a tropa sob controle. “Os GMs estavam desanimados. Ele não mandava mais em nada”, disse um deles.
Apear do comentário, o prefeito Samuca Silva mantém otimismo com a Guarda Municipal e pediu que os GMs honrem a farda que vestem. “Essa solenidade mostra a grandeza da Guarda Municipal de Volta Redonda, que faz tanto para todos nós. Agora passa por uma modificação visando a segurança pública do cidadão. Volta Redonda, que tem se destacado em controlar os índices de segurança pública, mesmo sendo uma responsabilidade dos governos Estadual e Federal, investe através de sua secretaria de Segurança Pública. E é assim, no dia a dia, com muito trabalho, fazendo modificações e investindo em segurança, que vamos dar o conforto para a sociedade. Honrem a farda que vestem”, pediu Samuca.
Ao ser questionado sobre o processo de militarização que a GM vem sofrendo ao longo dos últimos anos, o prefeito garantiu que isso não existe em Volta Redonda. Na opinião dele, conceder o porte de armas de fogo aos guardas não significa transformá-los em mini policiais militares armados e mal preparados. “É uma forma de defesa. Eles (os GMs) lidam com o perigo constante, com bandidos, com o tráfico de drogas e outras. Eles precisam proteger a própria vida”, argumentou.
Sobre o futuro da GM em Volta Redonda, o novo comandante conversou com exclusividade com o aQui. Dales-sandro falou sobre a militarização, citou os problemas enfrentados pela corporação e tratou de um tema que incomoda dez em cada dez motoristas voltarredondenses: os atrevidos flanelinhas, um problema que aflige o município há décadas. Leia a seguir
aQui: Qual sua principal missão ao assumir o comando da GM de Volta Redonda?
Dalessandro: “Nós vamos manter o que estava dando certo e procurar aprimorar as coisas que não estavam funcionando, criar coisas novas, melhorar nossa integração em todos os setores da prefeitura e com os órgãos de segurança pública e com as comunidades. Vamos procurar estar sempre próximos da população.
aQui: E o que não estava dando certo?
Dalessandro: Por falta do efetivo, não conseguíamos cobrir tudo. A Guarda Municipal, às vezes as pessoas não sabem, mas tem várias atribuições e isso gera a falta de guardas nas ruas. A gente vai tentar planejar melhor essa participação da guarda na vida do cidadão e contando também com um novo efetivo que está chegando.
AQui: Temos acompanhando um comportamento típico militar dentro da corporação. Inclusive, o ex-comandante adotou um discurso militarizado no vídeo polêmico que o tirou do comando. Qual sua opinião sobre essa questã?
Dalessandro: Temos que pegar as coisas boas, que funcionam. O que funciona no militarismo: a disciplina. Lógico que a gente não vai ser militarizado. A gente vai pegar as coisas que podem funcionar aqui. A Guarda é uma instituição civil, uniformizada e a gente precisa sempre da disciplina. Então essa é a parte que vamos pegar do militarismo.
aQui: Recentemente a Guarda foi alvo de duras críticas por parte da população no que diz respeito à sua atuação no decorrer da obra no Belvedere. Há denúncias, por exemplo, de viaturas vazias enquanto o caos acontecia no trânsito. Foi falta de efetivo ou simplesmente falta de organização?
Dalessandro: Então. Foi um pouco de cada coisa e principalmente (a culpa) da grande demanda que nós temos. Se for olhar a (lei) 13022, que rege a Guarda Municipal, ela demanda muitas áreas de atuação. E, assim, fazemos desde acidente sem vítima, atendimento na área de saúde… é muito complexo. E nem sempre a gente pode atender naquele exato momento da necessidade.
aQui: O senhor já tem uma estratégia específica para atuar na questão dos flanelinhas?
Dalessandro: Sim. Nós já iniciamos uma campanha, se não me engano, na última quarta-feira com educação e formação para tentar oportunizar os flanelinhas um acordo que está sendo estudado ainda pela prefeitura. E aos contribuintes tentamos atualizálos e informá-los de como a Guarda age nesse sentido. Não há uma lei específica onde a Guarda possa se amparar para combater, digamos assim, os flanelinhas. O que há são outras medidas, baseadas no Código Penal, caso eles tomem certas ações contra as pessoas. Então a gente pede para as pessoas não fomentarem essa prática do flanelinha. Tem o parquímetro, que é regulamentado dentro da lei. O órgão público só pode fazer o que está expressamente dentro da lei.
aQui: Mas, as pessoas acabam pagando o flanelinha por medo. Caso o motorista se recuse a pagar ele vai sempre encontrar um guarda por perto – pelo menos nos lugares de grande concentração de flanelinhas – para garantir a integridade do seu veículo?
Dalessandro: Hoje, por exemplo, nós conseguimos realocar e temos um efetivo de média, na Vila, de 8 guardas. Então vai ter sempre alguém mais próximo para esse cidadão buscar sua ajuda. Inclusive num panfleto que nós entregamos, na parte de trás dele está falando em qual situação a Guarda pode atuar em relação aos flanelinhas porque pedir não é crime. Bem como pedir para tomar conta ou lavar o carro. Mas se ele se exceder, coagir alguém ou algo do tipo, nós poderemos atuar.