Por Vinícius de Oliveira
Depois de quatro meses de uma dramática novela que se estendeu no Legislativo voltarredondense, em uma sessão histórica realizada na noite de ontem, 21, os 19 vereadores presentes votaram pela cassação do mandato do colega Paulinho do Raio-X. Nem mesmo os vereadores de oposição a Samuca, inclusive que foram citados no processo, aliviaram a barra do já ex-parlamentar. Detalhe: Paulinho estava no Rio de Janeiro tentando, via Tribunal de Justiça, melar a sessão que acabou por afastá-lo do poder.
Contudo, alguns desafetos de Samuca não perderam a oportunidade de alfinetar o prefeito, chamando-o de bandido e trapaceiro. Foi o caso do vereador Carlinhos Santana. “Eu não falo com esse prefeito porque não me misturo com bandido. A intenção dele é acabar com minha vida, mas ele está lidando com um homem de bem e não vai conseguir fazer o que pretende”, disparou Carlinhos, que chegou a ter o nome citado no caso de extorsão contra Samuca.
Mas quem quase se descontrolou foi o presidente da Casa, vereador Neném, outro que teve o nome citado no processo que investigou Paulinho. “Eu liguei para esse prefeito uma única vez. Mas isso também não tem problema, porque sou o presidente da Câmara. Mas esse mau caráter usou isso contra mim. Em outras oportunidades, tentou me comprar”, bradou Neném, revoltado.
O único vereador da base que se atreveu a se pronunciar foi Rodrigo Furtado. “Eu não queria ser o capataz nem o algoz dessa história. Mas não poderia deixar um fato tão importante como esse manchar o nome desta Casa, que é um lugar de moralidade e Justiça”, resumiu o ex-presidente da CPI que deu início a todo o processo contra Paulinho.
Para o lugar de Paulinho do Raio-X, Neném vai convocar o jovem empresário Marcelo Moreira para assumir o cargo de vereador de Volta Redonda. A posse deverá ocorrer assim que todos os trâmites legais forem cumpridos.
Entenda o caso:
Em março, o vereador Paulinho do Raio-X, de oposição, resolveu ter uma ‘conversinha’ com Samuca Silva para lá de indecorosa. Em local bem discreto: uma lanchonete na Dutra. Ou em uma das salas de radiologia do São João Batista. O tête-à-tête acabou se desenrolando no Pontual Shopping, na Vila. Foi na sala 828, no dia 7 de março, que o parlamentar colocou Samuca contra a parede, pedindo o que chamou de ‘injeção’. Após dizer que a sua ‘dolorida’ seria pequena, teria dito que iria dividir a dose com outros vereadores. Acabou preso em flagrante após ser dominado por policiais e pelo próprio prefeito, que, armado, teria ajudado lhe dando voz de prisão.
No bojo da conversa, a moeda de troca apresentada por Paulinho era o impeachment por conta de emendas impositivas, protocolado por Carlinhos Santana, que perturbava o sono de Samuca. Conforme um dos vídeo gravados por Samuca, feitos sob orientação do Ministério Público, Raio-X prometia que não haveria estardalhaço com relação ao impeachment e outros que estavam por vir. Para isso, bastava Samuca liberar R$ 325 mil. “Me arruma isso aqui [escreveu a quantia no papel]. Eu destruo geral. Segunda-feira, o carro de som não vai estar na prefeitura. Não vai ter tribuna sobre esse assunto. Vai ter tribuna, mas não sobre esse assunto”, prometeu Paulinho.
Quem deu os detalhes foi Ana Paula Faria, delegada da Coordenadoria de Investigação de Agentes com Foro da Polícia Civil. “Ele solicitou a quantia de R$ 325 mil, valor total num primeiro momento. Posteriormente, nesse sábado [7 de março], ele confirmou, renovou a solicitação do dinheiro justamente no intuito de que os outros dois impeachments, já que o primeiro já tinha sido aberta a sessão e já tinha havido votação e não tinha prosperado, para que os outros dois impeachments que estavam engatilhados para sair não fossem levados à frente”, explicou a policial.
Indignado com a ousadia, o vereador Rodrigo Furtado, com base nos fatos, deu início à Comissão Parlamentar de Inquérito, que acabou conhecida como ‘CPI da Injeção’. “Eu sempre defendi, acima de tudo, a Justiça e a legalidade com a coisa pública. Independentemente de compor a base do prefeito ou não, estaria mutilando meus próprios princípios e a confiança de meus eleitores se fizesse vista grossa para o caso do Paulinho. Nunca, na história desta cidade, a Câmara foi tão envergonhada”, pontuou Rodrigo, que presidiu a CPI até o início deste mês.
A empreitada lhe custou caro. Assim que as diligências começaram, Rodrigo passou a ser atacado pela internet. “Envolveram meus parentes na história. Dispararam fake news dizendo que minha irmã estava nomeada na prefeitura recebendo rios de dinheiro, mas não trabalhava. Depois falaram de drogas e ‘oba-oba’ no meu gabinete. Tudo sem apresentar provas, apenas com o intuito de me difamar e tumultuar as investigações”, relembrou Rodrigo, desconfiado de que os ataques (a maioria veiculados pelo perfil fake Vila Brasília em Foco, grifo nosso) foram orquestrados por pessoas ligadas a Paulinho e seus aliados. “Levei o caso para a Polícia. Tenho certeza que a verdade ainda vai prevalecer”, aposta.
Mas não foi só Rodrigo que passou por dificuldades. A própria CPI presidida por ele quase morreu. Com a saída de Dinho da relatoria para assumir a presidência da Comissão Processante (ver box), o presidente da Câmara, Nilton Alves de Faria, o Neném, também investigado por ter sido citado em um dos vídeos, não quis dar posse a Buchecha, suplente de Dinho na CPI. A ideia era indicar Granato, também de oposição a Samuca. A tática não deu certo.
Quebra de decoro
Na terça, 18, Rodrigo Furtado apresentou o relatório final da CPI, orientando seus colegas a cassarem o mandato de Paulinho do Raio-X. “Depois de ouvirmos todas as testemunhas, e o próprio Paulinho, além de verificar os vídeos frame a frame, não nos restou dúvidas de que houve clara intenção de extorquir o prefeito enxovalhando o nome da Casa que deve ser, constitucionalmente, uma instituição ilibada e que funciona em favor da população, e não da corrupção. Diante disso, o relatório não poderia ser diferente. Por isso, a Comissão pede a cassação do vereador investigado”, resumiu Furtado.
Antes, para garantir que Paulinho seria de fato julgado, já que a CPI, por si só, não tem poder de afastar políticos, mas apenas de expor os fatos, Rodrigo fez uma denúncia formal contra Raio-X, obrigando a Câmara a instaurar uma Comissão Processante (CP). Essa, sim, com prerrogativa para cassar Paulinho. “O mote dessa comissão é averiguar a quebra de decoro protagonizada por Paulinho. Conforme constatamos nos vídeos, ele não agiu dentro das prerrogativas cabíveis a um vereador, agindo feito um chantagista. Não há dúvidas de que isso se configura como quebra de decoro parlamentar”, explicou Rodrigo.
A princípio, nenhum dos vereadores sorteados para compor a Comissão Processante estava disposto a assumir a responsabilidade de julgar Paulinho. A tarefa coube a pastor Washington, Rosana Bergone e Sidney Dinho, sendo que a presidência ficou com Dinho. Não demorou muito e Paulinho insinuou que Dinho iria absolvê-lo. Maldade pura. “Repudio a fala do vereador no que diz respeito a qualquer tipo de conversa ou compromisso de votar a favor dele… Assim sendo, afirmo com toda certeza que o vereador foi muito infeliz ao faltar com a verdade afirmando que votarei a seu favor”, asseverou, enterrando qualquer possibilidade de ajudar Paulinho.
O desesperado
Sendo investigado por duas comissões distintas, algo que nunca se viu na história do parlamento voltarredondense, Paulinho do Raio-X não entregou os pontos facilmente. Mesmo mal assessorado no início, usou inúmeros recursos para tumultuar as investigações e protelar a decisão da Câmara com a intenção de preservar seu mandato e poder concorrer à reeleição. A primeira estratégia foi alegar transtornos mentais. Pelo menos é o que consta de um atestado médico apresentado por ele que, convenientemente, lhe garantia imunidade por tempo suficiente até que o prazo da CPI expirasse.
Não satisfeito, Paulinho resolveu vazar pequenos vídeos, editados, pela internet logo depois do seu segundo depoimento à CPI. No primeiro, aparece xingando Samuca e dando a entender que um colega seu da Câmara ser usuário de drogas. Tudo sem provas, vale ressaltar. Dias depois, novos mini vídeos apareceram. Três para ser exato. Lendo o seu próprio depoimento, Raio-X ataca novamente Samuca, alegando que fora agredido e ameaçado por uma arma. E pela primeira vez ele se descontrola. Ficou calado, bebeu água e ameaçou chorar. Triste espetáculo.
Num segundo vídeo, Paulinho diz que o prefeito o chamou de “filho da puta” e mais uma vez se descontrolou. Foi quando mencionou a própria mãe, já falecida. Por fim, no terceiro vídeo, Raio-X tratou dos cargos comissionados da prefeitura e afirmou que o prefeito teria medo de um vereador pré-candidato à prefeitura (Granato, grifo nosso). Aproveitou para dar a deixa de que Samuca distribuía “R$ 50 mil em cargos comissionados” aos vereadores da sua base. Mais uma vez, sem provas.
Já à beira do abismo, a última de Paulinho não foi nova. Seguiu a velha prática de ‘dar bolo’, assim como o fez quando convocado a depor diante das comissões e não deu as caras na sessão do dia 20, quinta, que votaria pela cassação ou não do seu mandato. Ontem, sexta, 21, não teve como fugir do pepino.