Vinicius de Oliveira
A discriminação sofrida pelas mulheres em posições estratégicas é fato recorrente no mercado de trabalho, em particular no Brasil. Mesmo que tenham mais qualificação que os homens, isto não se reflete nos seus salários e nos cargos por elas ocupados. Os avanços sociais nas questões de gênero, inclusive, não se refletem na comparação entre mulheres executivas na mesma proporção que os homens, tanto no setor privado quanto público.
E um projeto de extensão de estudantes de Direito do UGB, por meio da próreitoria de Pós Graduação, Pesquisa e Extensão (PROPEX-UGB), na pessoa da professora Lúcia Costa, sob a supervisão do professor do Curso de Direito, Daniel Souza Silva, com os alunos Matheus de Souza Braga de Araújo Batalha, Kenia Nogueira de Caeres, Karoliny de Oliveira Alves Alberice e Jade Azevedo Lage de Freitas, percebeu que o machismo que impede a ascensão profissional da mulher é tão profundo que encontra lastro até no ordenamento jurídico.
E coube a Daniel explicar a situação que o país se encontra nesse sentido. “Acho que uma cultura machista já é a própria origem das regras sociais vigentes, dentre elas, as regras do Direito. Por décadas, a lei já pressupunha que apenas os homens ocupavam espaços de poder, reproduzindo sua forma de ver o mundo como se fosse a forma universal. É muito recente a guinada de reconhecer a figura da mulher nas relações públicas e de poder, onde historicamente eram designadas apenas para funções privadas e familiares. O Direito é um reflexo das relações sociais de um determinado povo”, explica.
As pesquisas supervi-sionadas por Daniel Souza, que além de professor é advogado especialista em Direito Administrativo e Empresarial, levaram à produção de dois artigos científicos. Ambos analisam as dificuldades da entrada da mulher nos altos escalões do mercado, tanto no setor público quanto no privado, sempre sob a ótica do Direito. “Está incorporado aos nossos padrões culturais a ideia de que a mulher tem que interiorizar no papel de mãe e ser a responsável exclusiva pelas tarefas domésticas. Portanto, mesmo com o ingresso dessa mulher nas instituições de ensino e no mercado de trabalho, não houve alteração significativa na divisão interna de tarefas do lar. Portanto, as novas incumbências da vida profissional não resolveram as tensões e as disparidades impostas ao grupo feminino, eis que subsistem as obrigações com vida familiar”, pontua.
Ainda de acordo com o estudo, um certo conservadorismo cristão influenciou os hábitos e costumes da sociedade e dos legisladores, e de quebra conduziu o pensamento das próprias mulheres, restringindo seus desejos pessoas ao trabalho doméstico. “É evidente o preconceito em desfavor do crescimento profissional das mulheres, oriundo de um pensamento conservador cristão, onde o papel da mulher é reduzido em ser mãe e uma esposa. O preconceito agrega muitas barreiras no mercado de trabalho. Muitas mulheres acabam optando por gerar renda com microempreendedorismo, uma vez que se trata de atividade mais conciliável com as tarefas domésticas e com a maternidade, ao invés de assumir grandes obrigações hierárquicas nas corporações”, avalia.
Apesar dos avanços conquistados pelas feministas, a pesquisa encabeçada pelo advogado Daniel Souza observa que o pouco espaço aberto para elas foi a partir de interesses do próprio mercado. “O ingresso inicial das mulheres no mercado de trabalho foi marcado por uma incorporação apressada, brutal e com baixíssima segurança para as mulheres. Os resultados foram lesões e mortes. As condições de trabalho eram bastante prejudiciais aos trabalhadores, sobretudo, para as mulheres. No Brasil, a situação social parece ser ainda pior e com mais dificuldades”, pontua, indo além.
“Em primeiro lugar, há uma característica específica do processo de formação da sociedade brasileira. Ao abrir alguns espaços na sociedade para as mulheres, optou-se por abrir espaços educacionais, e não espaços profissionais. Com todas as dificuldades inerentes, tal ingresso só ocorreu após os anos 60. Percebe-se claramente a restrição da mulher aos espaços escolares e universitários, como corolários do espaço doméstico”, afirma Daniel, que continua.
“A escola é vista como extensão do lar. No mercado de trabalho, onde circula riqueza e dinheiro, o espaço continuava cercado por homens. Só é possível pensar no ingresso da mulher em espaços extra lar nesse período. E a partir daí se tornou crescente a participação feminina na educação brasileira”, compara. “Nem na educação as coisas foram fáceis paras a mulheres”, destaca Daniel.
O advogado volta-redondense entende que o preconceito prejudicou todo o movimento. “Apesar de serem respeitadas pela sociedade, as educadoras eram vistas com preconceito. Afinal, lugar de mulher era em casa, cuidando dos filhos e do marido. Se ela não estava fazendo isso, era porque havia falhado, de alguma forma, na missão de ser mulher. Vagarosamente, com as revoluções industriais e tecnológica e com os homens nas guerras, mais espaços foram sendo abertos. E quando as mulheres passaram a ocupar outros postos de trabalho que não o da educação, inclusive o de chefia, os salários não acompanharam a guinada, causando um fenômeno percebido até os dias atuais no Brasil: a segregação hierárquica”, lamenta.
Teto de vidro’
“A expressão de segregação hierárquica’, desenvolvida na literatura especializada trata da tendência linear de que, quanto maior o cargo, maior a tendência de ser ocupado por homens. Nela, fica claro o posicionamento hierárquico engajado para constituir uma baixa representatividade do sexo feminino nos cargos mais elevados das grandes corporações. É a reflexão levantada pelo conceito de “teto de vidro” existente nos livros especializados. No Brasil, a presença de mulheres em altos cargos corporativos ainda é rara. E há presença evidente do chamado fator de “afunilamento hierárquico”, ou seja, quanto mais alto o núcleo de poder, ou maior o nível decisório associado ao posto de trabalho, a presença e a participação das mulheres é diametralmente menor, mesmo quando o quantitativo feminino é superior ao masculino”, defende um dos artigos escritos pela projeto desenvolvido pelo Professor Daniel Souza.