O acordo coletivo dos operários da CSN para 2022 tinha tudo para seguir o roteiro de uma novela mexicana, com final já conhecido. Tinha. Só que, logo nos primeiros atos, feitos no chão da fábrica de Volta Redonda, vários atores se insurgiram contra tudo e contra todos – em especial contra Silvio Campos, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, a quem acusam de pelego, palavra que sempre predomina quando envolve sindicalistas de esquerda e direita. E, claro, contra Benjamin Steinbruch, presidente da CSN, empresa que registrou lucros homéricos no ano passado, o que pode ter sido o estopim da crise que explodiu na cidade do aço.
Liderados por um pequeno grupo de ex-sindicalistas, mais preo-cupados até então em derrubar Silvio Campos, os metalúrgicos da CSN assumiram, no peito e no gogó, um protagonismo que nem a direção da siderúrgica esperava. “Foi pega de surpresa”, re-conhece uma fonte do aQui com trânsito junto à cúpula da CSN. “Aliás, ninguém esperava, nem o bispo de Volta Redonda. Ou melhor, nem eles (da oposição, grifo nosso)”, dispara ela, pedindo anonimato.
A irônica afirmação tem sentido. A prova é que os operários, entre um turno e outro, passaram a questionar a postura do Sindicato quando a CSN apresentou sua primeira proposta de reajuste salarial. Que foi recusada em assembleia na Praça Juarez Antunes. A partir daí, passaram a pedir por mudanças, e, principalmente, a exigir aumento real de salário (30%), entre outras reivindicações.
Insatisfeitos com a atual direção do Sindicato, e insuflados pelo grupo de oposição a Silvio Campos, centenas de coadjuvantes saíram cantando velhos refrões dos tempos de Juarez Antunes, ex-peão, ex-deputado federal e ex-prefeito, enquanto marchavam pelas ruas internas da usina até ganhar as principais avenidas da cidade do aço. A reação foi imediata e a CSN mandou demitir os líderes dos protestos, nove no total (há quem garanta que seriam 120). Acabaram reintegrados (por enquanto) por decisão Judicial.
Os nove demitidos, que ‘deram as caras’, viraram heróis de políticos, de vereadores que nunca pisaram no chão de fábrica. Conseguiram até ser recebidos pelo bispo de Volta Redonda, que desde que chegou vivia meio que arredio a movimentos sindicais. Fez com que muitos se lembrassem de D. Waldyr Calheiros, expressão máxima da Igreja Católica em Volta Redonda, que sempre defendeu os peões da CSN. O atual líder religioso recebeu os demitidos, prometeu rezar por eles e atacou o megaempresário Benjamin Steinbruch, presidente da CSN. Para ele, o empresário peca ao só pensar em lucros, explicou a jornais da região, esquecendo que a Igreja Católica é dona de um estacionamento rotativo na Vila e que, empresarialmente falando, também deve buscar lucros para se manter.
Acuado pelo movimento político-sindical, Silvio Campos reagiu. Na quarta, 11, divulgou boletim aos operários da CSN e adotou um discurso de greve. Na publicação, ameaçou parar a usina caso as negociações, que estão empacadas desde o dia 27 de abril, não sejam retomadas. “Vamos partir para a greve. Mas uma greve legal, seguindo todos os requisitos da lei”, ameaçou o líder sindical, indo além.
Lembrou que a crise financeira provocada pela Covid-19 ficou para trás e que o momento é de retomada da economia, inclusive com resultados financeiros positivos para a CSN. “Os trabalhadores estão vindo de um acordo que foi aprovado para evitar 1800 demissões, que aconteceriam em função da crise sanitária e a obrigatoriedade do lockdown. Hoje, a realidade é outra. A CSN deu a volta por cima e bateu o recorde, lucrando mais de R$ 13 bilhões em 2021. E, agora, não quer dar um pedaço do bolo aos que são verdadeiramente os responsáveis por esse resultado: os metalúrgicos, os mineiros e portuários”, ressaltou.
O boletim, na verdade, escondia o temor dos dirigentes do Sindicato (e talvez até da CSN) com a convocação de uma assembleia dos metalúrgicos para a tarde de quinta, 12, liderada pelo grupo de oposição a Silvio & Cia, com o objetivo de oficializar a existência da comissão de representantes, apoiados pela oposição sindical, para que seus integrantes possam participar das negociações entre o Sindicato e a CSN.
“A CLT prevê que um grupo de funcionários possa ser eleito para acompanhar as negociações salariais. Esse grupo atuaria como terceira parte: empresa – sindicato – grupo”, esclarece a fonte do aQui. “A Justiça de Volta Redonda reconheceu esse grupo (de oposição) por sentença, mas a CSN recorreu com um argumento decisivo: como pode ter legitimidade se nem eleito foi?”, indagou, reforçando a tese de que a assembleia de quinta, 12, tinha sido montada com o objetivo de legalizar o grupo de oposição. “Com o abaixo-assinado colhido na ‘assembleia’ (com cerca de 1.300 assinaturas, grifo nosso), agora eles estão legalizados como um grupo real”, disparou. “Vão poder participar das negociações, mas como testemunhas do processo. A definição do acordo continua dependendo da CSN e do Sindicato”, pontuou.
A fonte estava certa. A ‘assembleia da assinatura’ aprovou a criação do grupo de oposição sindical, que tem o apoio das centrais da Confederação dos Trabalhadores do Brasil (CTB) e da Conlutas, que já nasceu (oficialmente) acreditando que terá a palavra na próxima reunião do acordo coletivo, o que deverá ocorrer logo no início da semana.
GREVE
Mesmo com a participação de sindicalistas da oposição, com ou sem direito a dar pitacos, a CSN não espera que o movimento se radicalize. “Não acreditamos em greve. Historicamente, as negociações com a CSN são duras, mas, no fim, dão certo”, avalia a fonte. “O Silvio (Campos) deve conseguir da empresa uma nova proposta, melhor do que as que já foram apresentadas. Essa interlocução direta com a empresa é um ponto positivo para o presidente do Sindicato, que costuma ser ouvido e tem o respeito da empresa”, completou.
“O Silvio precisa que a CSN apresente uma nova e melhor proposta e com urgência. O movimento de greve (proposto por Silvio) deve apenas fortalecer esse grupo de oposição. Se ele não conseguir isso (a proposta e a aprovação), como é que ele vai enfrentar a eleição sindical nesse clima?”, finalizou.
PPR
O Programa de Participação de Resultados – antiga Girafa – dos metalúrgicos da CSN Paraná foi aprovado com 86,7% dos votos, durante assembleia realizada na segunda, 9, e prevê o pagamento de um abono relativo ao exercício de 2021. O acordo refere-se a 76% do target, mas os valores em reais não foram divulgados. Segundo informações da CSN, o pagamento do abono da PPR já está na conta dos trabalhadores desde ontem, sexta, 13. Vale ressaltar que o mesmo percentual de target foi oferecido aos operários da CSN UPV e da CSN Porto Real (GalvaSud) em conjunto com a proposta do ACT, mas os operários recusaram e exigiram um percentual maior.
Veja os nomes dos integrantes da Comissão de Negociação por parte da oposição sindical:
Ronald de Andrade Gomes
Felipe Anilio Santos
Marcelino Vieira Balbino da Silva
José Marcos da Silva
Ulisses Cesário de Oliveira
Felipe Correa Soares
Thales de Oliveira Ribeiro
Odair Mariano da Silva
Israel de Souza Azevedo