sábado, dezembro 14, 2024
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“Zero à esquerda”

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Mateus Gusmão

Quando o aQui chegou às bancas no sábado, 3, o meio político voltarredondense estremeceu. E com razão. É que três dos aliados mais próximos do prefeito Samuca Silva (PV) se envolveram em um tremendo quiproquó, revelado com exclusividade na edição passada. A trama do trio era para abortar um projeto de lei apresentado pelo vereador Luciano Mineirinho (PR) – padrinho de casamento de Samuca. Chegaram ao exagero de revelar que, se o PL fosse aprovado na Câmara, eles fariam com que o mesmo fosse vetado.

 

A estratégia de Maycon, Joselito e Maurinho foi divulgada em um grupo de empresários no WhatsApp. Em um áudio, o vice-prefeito Maycon Abrantes deixava claro que ele e o secretário de Desenvolvimento Econômico, Joselito Magalhães, já estavam articulando a reprovação do projeto de Mineirinho. Ganharam apoio do ‘assessor especial’ Maurinho Pereira, que chegou a reclamar do parlamentar, dizendo que ele não teria o direito de legislar sem antes consultar o ‘MEP da Burguesia’ – grupo criado para defender os interesses do empresariado local no Palácio 17 de Julho. 

 

A ira dos empresários contra o projeto de lei de Mineirinho é que, aprovado, iria obrigar as empresas, por exemplo, com mais de 500 funcionários, que contratassem 2% dos seus trabalhadores com mais de 60 anos. As pequenas e médias empresas também teriam um quinhão a dar. Mostrando que não devem conhecer de leis, pois o PL tem tudo para ser inconstitucional, os empresários chiaram. Mineirinho, por sua vez, chegou a retirar o projeto após conversar com alguns advogados, que deixaram claro a ele que o PL seria derrubado na Justiça. Retirou, mas jura que vai fazer modificações para reapresentá-lo na Casa de Leis. E se o fizer, o PL dos idosos tem tudo para ser aprovado por unanimidade, para desespero dos empresários da Aciap-VR.

Reação 

A tentativa de Maycon, Joselito e Maurinho de abortar o projeto de Mineirinho foi entendida pelos vereadores como uma tentativa de interferência da classe empresarial no Poder Legislativo. Por isso, o presidente da Câmara, Sidney Dinho (PEN), foi o primeiro a abordar o assunto na sessão de segunda, 5. Tendo uma edição do aQui nas mãos, com várias partes grifadas com marca texto, Dinho avisou: “Vou usar a tribuna para tratar disso”, disparou, mostrando que não estava nada satisfeito com a intromissão no Parlamento.

 

De início, Dinho lembrou que o Legislativo tem buscado ajudar o prefeito Samuca Silva – como ficou claro com a aprovação da mudança da lei que agora permite que Samuca possa remanejar até 25% do orçamento sem passar pelo crivo dos parlamentares. E, segundo ele, ao tomar conhecimento da trama dos empresários, isso o irritou profundamente. “Como presidente da Câmara de Volta Redonda, quando o Legislativo for atingido, eu darei as respostas em nome dessa Casa”, comentou.

 

O vereador fez questão de ler as partes da reportagem que estavam grifadas e foi tecendo comentários ponto a ponto. Um dos comentários de Dinho, por exemplo, foi tirar a responsabilidade do prefeito Samuca Silva sobre o quiproquó dos seus assessores. “Para fazer Justiça, não há qualquer menção ao prefeito nesse caso”, comentou, ressaltando que lhe causou estranheza ver que Maycon e Joselito Magalhães estariam trabalhando contra a aprovação dos projetos dos idosos. “Eu não recebi nenhuma ligação dele (Maycon), nem sei se outro vereador recebeu. O Joselito não me ligou. Se tivessem me ligado também (pedindo para votar contra o projeto), iriam receber um não”, acrescentou.

 

“Esses senhores (Maycon e Joselito) estão viajando. Estão achando que podem ingerir no Poder Legislativo. Ficam trocando áudio de lá para cá, achando que podem levar os vereadores para um lado e para outro. Isso aqui não é casa da Mãe Joana”, disparou Dinho. “Aqui a gente não se curva a interesse de empresário. A população tem prioridade”, destacou. “O vice-prefeito entrar nesse de áudio para cá e para lá é infantilidade”, avaliou.

 

Dinho ainda ironizou o fato de Maycon ter dito no áudio que estava trabalhando para ‘vetar o projeto’. “Até onde eu sei, quem veta projeto da Câmara é o prefeito. E ele se esquece que se o prefeito vetar o projeto, a gente pode derrubar o veto. O projeto nasce aqui e termina aqui na Câmara”, destacou Dinho, anunciando em plenário que, quando o projeto de Mineirinho for a votação, ele pode contar com o seu voto pela aprovação da proposta. 

 

Seguindo na leitura da reportagem, Dinho chegou à parte em que Maurinho Pereira, ‘assessor especial’ de Samuca, defende Maycon. “Esse cara era pré-candidato a prefeito em Volta Redonda. Cansou de vir à Câmara, sentar nessas cadeiras e dizer que era pré-candidato a prefeito”, comentou. “O que um cidadão desses está fazendo dentro do governo? Os idosos precisam ficar espertos, abrir os olhos com um cidadão desse tipo, que é assessor do prefeito”, acrescentou, dando a entender que Maurinho não deve gostar de idosos, por ser contra o projeto.

 

Tem mais. Dinho destacou o fato do empresário e assessor do prefeito ter dito que Mineirinho, antes de elaborar o projeto, deveria ter procurado os empresários que compõe o Fórum das Entidades Empresariais (MEP da Burguesia, grifo nosso). “Coitado do senhor Mauro Campos. Ele vai morrer esperando um vereador dobrar o joelho para ele para fazer um projeto. Ao invés de prestar obediência à população, vou ter que prestar a empresários?”, ironizou, salientando que não tem que ficar falando mal de empresários. “Só de empresários bocudos e que não conseguem guardar a língua na boca e ficam falando besteira”, bradou.

 

O presidente da Câmara foi além. Fez questão de destacar que o empresário (Maurinho) não pode fazer nada no Legislativo. “Não pode propor, não pode ingerir na votação, não pode ingerir no veto ou sanção de um projeto. É um zero à esquerda para a Câmara Municipal. Por isso eu disse para ele, um dia aqui com o plenário cheio: ‘quer fazer uso do microfone? Quer fazer o uso da caneta? Se candidata e ganha eleição’. Mas por enquanto é um zero à esquerda. Não pode nada”, completou, referindo-se a Maurinho, é claro.

 

Dinho repercutiu também a parte da fala de Maurinho onde ele diz que é a classe empresarial quem produz no Brasil. “Na realidade quem produz é o ajudante que está dentro da obra dele, é o pedreiro, o encarregado. Eu duvido que vocês mostrem para mim uma foto do Mauro carregando um carrinho de concreto na obra dele. Ou uma foto do vice-prefeito carregando um saco de batata dentro da rede de supermercado dele. Podem gerenciar muito bem os seus negócios e, aí sim, gerar empregos. É com a geração de emprego que vem a produção por quem trabalha na ponta da linha”, argumentou. “Além de ser contra o idoso, ainda quer ofuscar o trabalho de quem coloca a mão na massa e dá o sangue. Para de brincadeira, rapaz. Presta atenção”, disparou Dinho contra Maurinho.

 

O presidente da Câmara aproveitou para mandar um recado para o Palácio 17 de Julho. “A Câmara quer viver em paz com o governo, quer ajudar a fazer com que Volta Redonda caminhe. Aí vêm esses caras fazendo infantilidades, criancices, palhaçadas. Aqui não tem criança. Vocês têm que se colocar na posição de vocês”, bradou. “Um é vice-prefeito e está na condição de secretário e mais nada. Vice não manda em nada. Quem manda é o prefeito. O outro é secretário de Desenvolvimento e, se o prefeito der uma canetada, amanhã está fora. O outro é assessor especial, que é menos ainda que secretário”, completou.

 

“Prefeito Samuca Silva, se eu fosse Vossa Excelência, acenderia a luz vermelha com relação a essas três pessoas (Maycon, Joselito e Maurinho). Eles estão querendo queimar e acabar com a imagem do governo. São três irresponsáveis, pois não têm limites no que falam”, concluiu Dinho, sendo parabenizado pelos demais vereadores pelo discurso contundente contra a trama, o que interpretaram ser uma tentativa de interferência na independência do Poder Legislativo.

 

‘Não estamos aqui para agradar empresários’

Após o discurso contundente de Dinho, o vereador Luciano Mineirinho – alvo dos empresários – fez questão de externar sua opinião. “Eu acho que está na hora de falar. Esse áudio foi lamentável, horrível. Na verdade, eu fiz esse projeto de lei que beneficiaria os idosos– vai beneficiar, porque esse projeto continua”, disse, ressaltando que é muito difícil uma pessoa com mais de 60 anos conseguir um emprego formal. Segundo ele, o projeto – que não deixou os empresários felizes – foi tema de debate em um grupo de WhatsApp. “Não estamos aqui para fazer agrado pra eles (empresários). Estamos para trabalhar para a população”, disparou.

 

Mineirinho, quando ouviu Maycon falando do seu projeto, não acreditou no que estava escutando. “Ouvi até de novo”, pontuou. “Mas depois logo respondi que o vice-prefeito tem que tomar conta é da Smac e não de projeto de vereador. O projeto tem que ser discutido aqui na Câmara. O vice tem meu telefone, poderia ter me ligado”, ponderou, ressaltando que Maycon o convidou para uma conversa para lhe pedir desculpas. “O mais lamentável é que ele não conhecia o projeto de lei. O vice me pediu desculpa, ele sabe que errou e errou feio. Temos que ter um governo de diálogo. Estamos aqui na Câmara para ajudar a cidade”, pontuou.

 

O parlamentar salientou que a reportagem do aQui estava totalmente correta. “A fonte deles está certa e o áudio também. Não sei onde eles conseguiram isso, mas estão certos”, comentou, revelando que Samuca sabia dos áudios. “O prefeito repudiou totalmente a atitude do vice-prefeito, do Mauro Campos e do Joselito”, destacou Mineirinho, soltando a seguir uma informação que agradou aos parlamentares. Que caso o PL fosse aprovado, ele como prefeito iria sancioná-lo.

 

Quem também falou sobre a trama foi Neném (PSB), do grupo do ex-prefeito Neto. “Essa Casa tem ajudado o prefeito das melhores maneiras possíveis. Mas votamos com nossa consciência e o que for bom para a cidade. Agora, tem empresário que é o seguinte: quer ganhar muito, muito. Isso me assusta. E tem gente (empresário) na cidade que tem a boca muito grande”, completou.

 

Granato (PTB) classificou o áudio de Maycon e Maurinho como um erro primário. “Não estão preparados para assumir um cargo público”, disse. “O menino, vice-prefeito, está doido para ser deputado. Então esse áudio é coisa para agradar a empresário. Ele pode ter ganhado seis votos de empresários. Ele tem muita preocupação de um dia precisar de alguém. Nem tudo que é bom os empresários querem. O vice foi no mínimo deselegante. Depois vou ver se ele cometeu algum crime, vou levantar para ver se cabe algum crime de improbidade”, prometeu Granato.

 

O parlamentar, um dos mais experientes da Casa, ainda lembrou que o conluio dos empresários atingia um vereador da base verde. “Que isso sirva de recado para esses iniciantes. Se o prefeito não mudar meia dúzia de secretários, de presidente de autarquia, ele está fadado ao fracasso. É muita gente ruim para um lugar só. É muita gente ruim. Tem que mudar, pô. Eles ainda atrapalham o chefe do Executivo. A gente tem feito um trabalho para ajudar e esses aí tentando atrapalhar”, criticou Granato.

 

Fernando Martins (PMDB) disse acreditar que Maycon, como secretário de Ação Comunitária, cometeu um desvio de conduta, segundo a Lei Orgânica Municipal. “Ele merece uma advertência por isso”, destacou. Jari (PSB), por sua vez, disse ter ficado estarrecido com a situação, já que a Câmara tem tentado ajudar o prefeito no que pode. “E vemos o vice-prefeito, um secretário e um assessor preocupados, muito preocupados, com interesses próprios do empresariado, deixando os interesses da população em segundo plano. É de causar estranheza. O prefeito tem trabalhado intensamente pensando na população. O prefeito tem que ficar atento”, alertou.

 

Outro experiente parlamentar, Edson Quinto (PR), disse que a Câmara foi ofendida pela trama dos empresários. “Até parece que tem alguém que mande aqui dentro. Achei muito estranho quando vi essa matéria. Isso é uma luz que se acende vermelha para o prefeito. Nós, 21 vereadores, temos pessoas que representam a gente. Temos a nossa assessoria. E esse assessor, se não representar bem o parlamentar, ele queima o filme do vereador. O mesmo acontece com a assessoria do prefeito”, comparou, dando a entender que Maurinho e Joselito estariam queimando a imagem do governo verde. Pode ser!

Pedido de desculpas

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O clima entre os vereadores estava tão ruim e preocupante que Maycon Abrantes (PV) foi à Casa de Leis na noite de terça, 6. Chegou cedo, se reuniu com Sidney e depois foi ao plenário para se retratar diante dos parlamentares. Graças a Dinho, que abriu uma exceção, Maycon pôde usar a tribuna por alguns minutos antes do início oficial da sessão. “Hoje eu venho aqui para poder conversar, esclarecer de uma forma breve e sucinta, todo mal-entendido”, disse Maycon, referindo-se ao áudio divulgado pelo aQui. “Já havia conversado com o vereador Mineirinho assim que soube que o áudio havia sido divulgado em um grupo de WhatsApp. Eu pedi desculpa a ele pela forma que foi colocado e divulgado o áudio. Fui cobrado sim por alguns empresários, mas não sabia ainda do inteiro teor do projeto de lei apresentado pelo vereador”, disparou, colocando-se à disposição para ajudar em um projeto que beneficie os idosos.

 

Maycon lembrou que ligou para Mineirinho assim que leu a reportagem do aQui. “Eu disse para ele que esse era o momento da gente estar mais unido e discutir o projeto de lei que vai de encontro (sic) com o que pensamos: de desenvolvimento e geração de empregos”, destacou, ressaltando que os áudios teriam sido divulgados de maneira irregular, sem esclarecer se a ‘irregularidade’ teria sido cometida por integrantes do grupo de WhastApp ou pelo aQui, que recebeu o áudio de uma fonte, que pede que seu nome não seja revelado.

 

O vereador Carlinhos Santana (SD) foi o único a fazer questionamento a Maycon. Foi uma pergunta curta e simples. Se o áudio, divulgado pelo aQui, era verdadeiro ou falso. “É verdade”, engoliu Maycon, antes de ir embora.

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