Vinicius de Oliveira
O número de crimes violentos no Rio de Janeiro caiu no mês de fevereiro. Em comparação com o mesmo período do ano passado, houve uma queda de 9,2% nos casos de homicídios em geral. Os números são do Instituto de Segurança Pública (ISP), ligado à secretaria de Estado de Segurança Pública (Seseg), cantados em verso e prosa pelo Palácio do Planalto, dando a entender que a intervenção militar tem operado milagres na cidade maravilhosa. Mas enquanto o governo Federal e os cariocas comemoram a redução nos casos de violência letal, Volta Redonda, Barra Mansa e Pinheiral têm motivos de sobra para se preocupar. É que quatro dos seis crimes violentos monitorados mensalmente pelo 28º Batalhão da Polícia Militar registraram alta em 2018.
Coincidência ou não, a violência na região dá mostras de que aumentou desde a intervenção militar no Rio de Janeiro. Ainda é cedo para afirmar se os temores dos prefeitos do Sul Fluminense, de que a bandidagem da capital migraria para a região a fim de se livrar da repressão de tropas do Exército, se concretizou, mas, como bem disse o ex-delegado da 93ª DP, Marcello Russo (hoje em Duque de Caxias), não se pode fechar os olhos para os números, sob risco de trazer para o interior a guerra insana contra o tráfico.
Segundo os dados divulgados pelo ISP, o que mais aumentou em Volta Redonda, Barra Mansa ou Pinheiral foram as apreensões de droga. Enquanto em fevereiro de 2017 a Polícia Militar registrou 47 casos do tipo, em 2018 o número saltou para 86. Ao longo do ano, a PM esteve nas delegacias dessas três cidades citadas acima 982 vezes para relatar apreensões de entorpecentes.
Tantos casos podem estar ligados ao fato de que as cidades em questão estão às margens da Via Dutra, considerada pela Polícia Rodoviária Federal uma das principais rotas de entrada de drogas no Brasil. De acordo com dados divulgados pela PRF, em 2017 foram aprendidas mais de uma tonelada de maconha, além de 50 quilos de cocaína.
No segundo lugar da lista divulgada pelo ISP aparecem os casos de roubo em geral. De acordo com a instituição, que levou em consideração investidas criminosas a estabelecimentos comerciais, bancos e a transeuntes, o 28ª Batalhão da PM notificou 55 assaltos em fevereiro de 2018. Já no mesmo período do ano passado, foram apenas 20 casos. Ou seja, um aumento de 175%.
De fevereiro de 2017 a fevereiro de 2018, as três cidades sob jurisprudência do 28º BPM sofreram, segundo o ISP, 843 assaltos de toda ordem. Vale lembrar que o ex-comandante da unidade, tenente-coronel Márcio Guimarães, que foi transferido devido à intervenção militar, já havia sinalizado que, principalmente, Volta Redonda e Barra Mansa eram campeãs nesse tipo de crime, especialmente os cometidos nas ruas, a pedestres.
“Identifiquei altos índices de roubos de rua. Vimos que a crise do estado não só causou desemprego na população, mas também prejudicou o trabalho da PM, pois, entre outras, há falta de manutenção das viaturas e, com isso, com menos patrulhamento, esses tipos de delitos, principalmente roubo de carros e celulares, aumentam”, explicou Márcio ao aQui, quando ainda comandava o 28º.
Na época, Márcio chegou a mencionar que tipo de estratégia usaria para tentar diminuir as incidências de roubos, mas não teve tempo de agir. “É preciso trabalhar com o que temos. O efetivo é pequeno, muitas viaturas estão precarizadas e faltam boas condições, mas precisamos estabelecer estratégias e fazer a lei ser cumprida. A ideia, então, é priorizar a aplicação do efetivo em dias e horários onde a PM se faz mais necessária. Em Barra Mansa, no Centro e, em Volta Redonda, na Vila. Só de se fazer presente, a PM já faz toda a diferença”, acreditava.
Os registros de mortes de suspeitos em confronto com a polícia – os chamados autos de resistência – também apresentaram crescimento. Ainda de acordo com o levantamento do ISP, no ano passado ninguém fora morto resistindo à prisão. Mas já neste ano, duas pessoas acabaram morrendo se opondo à intervenção policial. Estes foram os únicos casos registrados em um ano.
De acordo com Marcello Russo, o fato é que os criminosos gostam de facilidade tanto que, nos casos de crimes de rua as vítimas preferenciais são mulheres e idosos. “Ou seja, pessoas que têm uma fragilidade maior para conseguir êxito no roubo ou furto. A mentalidade de raciocínio do criminoso é de se escusar e se esforçar o mínimo possível. Seguindo esse raciocínio, veremos que o Rio está cercado pelo Exército, com forças militares na rua. Equipamento como tanques e homens armados fazendo o cerco ostensivo nas vias públicas. A Guarda Nacional também está nas principais vias e existe um planejamento maior integrado entre as forças de segurança tanto da PM, Civil, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal. Tudo isso significa um cerco, um abafamento nas operações criminosas na capital. Principalmente os locais que são dominados por facções criminosas”, analisou o policial.
Na teoria apresentada por Marcello Russo, a tendência é justamente que os criminosos fujam da capital e procurem lugares mais seguros para eles próprios, onde possam manter funcionando a máquina do tráfico. “Não sendo efetivadas as prisões dos líderes e gerando apenas a sensação de segurança já que, de fato, os números violentos têm diminuído no Rio, é natural que o criminoso parta para outros lugares. Então, realmente é um risco o crescimento da criminalidade nas regiões, nos municípios periféricos que não estão com esse aparato do exército, sofrendo essa intervenção na forma que a capital está sofrendo”, disse.
“Então eles (os bandidos) vão procurar esses lugares. É uma questão de alta sobrevivência. O crime vai tentar sobreviver em novas regiões mais seguras para si. Acredito que seja uma consequência de estratégia natural”, complementou, salientando que a população do interior já vinha amargando, antes mesmo da intervenção federal, com números violentos até então registrados somente na capital. “Foi o caso de Angra dos Reis, Paraty e até no Sul Fluminense sentimos reflexos do aumento do crime. Já foram presos homens importantes do tráfico carioca em Volta Redonda, que estavam na cidade praticando delitos, ensinando métodos aos traficantes daqui ou, até mesmo, aumentando o alcance de seu comércio”, completou Russo.
Ao ser questionado se a presença de tropas do Exército no Sul Fluminense seria essencial para impedir a ‘transferência de crimes’, Russo disse que o ideal seria manter vigilância em lugares estratégicos e não colocar tanques de guerra e soldados armados nas ruas. “Eu diria que não necessariamente a presença do Exército no Sul Fluminense faria diferença, mas, sim, nas principais vias de acesso e nas fronteiras dos municípios. Como, por exemplo, na Dutra e outras vias e rodovias federais e até estaduais importantes para que seja feito um controle maior dessa mobilidade. Seria muito bem-vindo um cerco nesse sentido”, sugeriu o delegado.