Por: Roberto Marinho
A vida de artista é mesmo difícil. Além de não ser valorizada no Brasil – a ponto do governo Temer tentar acabar com o registro profissional para quem quer tentar exercer a profissão –, o trabalho é escasso. Pior: o dinheiro é pouco, pelo menos para a grande maioria. Por isso, quando há a oportunidade de mostrar o trabalho para um público maior, e ainda ter a possibilidade de ganhar um prêmio (em espécie!), qualquer artista se anima.
Foi o que aconteceu com centenas de artistas que se inscreveram no 29º Salão Internacional de Humor de Volta Redonda, realizado em novembro de 2017. Considerado como um dos cinco mais importantes salões de humor do Brasil, o evento teve “uma grande novidade”, conforme divulgou, na época, a secretaria de Cultura: pela primeira vez, aceitaria trabalhos de outros países. “A competição aumenta e a qualidade dos trabalhos também. Esperamos bater recorde de inscrições esse ano”, comemorou a secretária de Cultura, Aline Ribeiro, aos jornais, quando o salão foi lançado. Na época, Aline era interina, e no início de 2018 foi efetivada à frente da pasta.
Só que a novidade acabou estragando o humor dos felizardos que foram premiados. E que até hoje eles não viram nem um centavo do total de R$ 28 mil que seriam distribuídos na premiação, divididos por categorias. Os vencedores das modalidades Cartum, Charge, Caricatura e História em Quadrinhos, receberiam prêmios no valor de R$ 4 mil. Para os segundos lugares, também nas quatro modalidades, o prêmio seria de R$ 2 mil. E havia ainda o Prêmio Especial, no valor de R$ 2 mil, para o melhor trabalho inscrito por artista residente em Volta Redonda, e uma premiação especial para o tema “Lava Jato”, que pagaria também R$ 2 mil, totalizando os R$ 28 mil de premiação.
Tá de brincadeira?
O pior é que a resposta da secretaria de Cultura para o atraso no pagamento dos prêmios parece uma baita piada de mau gosto. “Dentre os vencedores, alguns são estrangeiros, o que nos termos da administração pública implica em metodologias ainda mais burocráticas que tornaram o processo de pagamento mais demorado do que o previsto, alguns dos ganhadores demoraram muito para encaminhar documentação necessária, e ainda devido a contrastes no regimento interno de diferentes países”, diz a nota enviada ao aQui pela pasta, que não nega a dívida.
A lista de vencedores estrangeiros traz quatros artistas: dois da Ucrânia, um colombiano, e um alemão. E de acordo com o regulamento divulgado na época, os pagamentos seriam feitos por meio de depósito bancário, com os dados previamente fornecidos na inscrição. O regulamento não especificava, entretanto, como seria feito o pagamento a estrangeiros, tendo como única ressalva que os participantes de países que enfrentassem embargos econômicos de qualquer natureza com o Brasil, que impossibilitassem a transferência de valores monetários, só poderiam concorrer de forma honorífica, ou seja, teriam que abrir mão da premiação. Mas, até onde consta, nenhum dos participantes mora em países nessa situação.
Genial
Ou seja, a ideia genial para “aumentar a competição e a qualidade dos trabalhos” (sério isso?!) acabou atrapalhando todos os artistas premiados, não importa se gringos ou brasileiros. Estão todos agora de mão abanando, por conta da burocracia envolvida. A pergunta que fica para os responsáveis é a seguinte: será que ninguém pensou nisso antes?
Aline Ribeiro, que tem se envolvido em vários imbróglios desde que assumiu a pasta, garantiu, no entanto, que o pagamento será realizado “conforme previsto no edital”, e que há uma equipe “empenhada em cumprir legalmente todas as demandas para a realização do pagamento”.
O problema é que o edital de premiação – publicado na edição nº 1404 do Volta Redonda em Destaque, de 13 de outubro de 2017 – não especifica nenhuma data para o pagamento, assim como o regulamento, que ainda está disponível no endereço eletrônico da secretaria de Cultura – no link http://www.voltaredonda.rj.gov.br/cultura/9-noticias-destaque/294-salao-internacional-de-humor-de-volta-redonda-2017 – clicando em “regulamento em português”.
Há também versões em inglês e espanhol, mas em qualquer língua, a resposta parece aquela velha máxima, com uma nova roupa: devo, não nego, enrolo enquanto puder. E fica o registro: É uma pena que o prefeito Samuca Silva tenha sido levado a mais um quiproquó internacional.