Paolla Gilson
Embora já existissem antes, foi na década de 70 que as Associações de Moradores cresceram. No turbilhão de protestos contra o regime militar, os movimentos populares urbanos passaram a ganhar força. Encarregadas de cobrar das autoridades providências de diferentes tipos, como distribuição de água, coleta de lixo, alimentação adequada para as crianças e serviço de Saúde eficiente, essas entidades chegaram a viver momentos de glória, inclusive em Volta Redonda.
Durante os governos do ex-prefeito Neto, por exemplo, o tapete vermelho era estendido aos representantes das Associações de Moradores, que encontravam as portas do Palácio 17 de Julho sempre abertas. Além da FAM (Federação das Associações de Moradores), criada em 1991 para ‘organizar’ as cerca de 100 associações, o ex-chefe do Executivo mantinha um grupo composto por candidatos a vereadores, que não haviam sido eleitos em diferentes eleições municipais, e ex-vereadores, que tinham a função de atender aos líderes comunitários, ouvindo suas reivindicações, buscando soluções para os problemas. Nesse sentido, era adotada uma postura de proximidade com o poder para que os votos dos moradores-eleitores não se dispersassem. Não fossem para a oposição.
Quem se lembra muito bem dessa época é a vereadora Rosana Bergone, que dirige a Associação de Moradores do Verde Vale há 26 anos. De acordo com ela, Neto dava atenção especial aos líderes das comunidades, apresentando-lhes, de forma clara, detalhada e adiantada, as informações sobre serviços que a prefeitura de Volta Redonda iria realizar em seus respectivos bairros. “O Neto oferecia um retorno. Quando não dava para fazer algo, ele dizia que não iria dar. Mas sempre havia uma possibilidade de negociação. As Associações sabiam exatamente a parte delas que seria incluída no Orçamento Participativo”, contou.
A parlamentar fez questão de explicar, em detalhes, como funcionava o esquema do Orçamento Participativo durante a gestão Neto para embasar seu posicionamento: “As Associações faziam suas reuniões, chamavam os moradores e montavam as obras que seriam incluídas no orçamento mediante a fala deles (moradores). Isso ia para um banco de dados para ser discutido depois entre o presidente da Associação, o prefeito e todo o seu secretariado. O que não podia ser feito permanecia lá no banco de dados. Quando entendíamos que era caso de urgência, íamos até o prefeito ou aos secretários. Quando o prefeito reavaliava a proposta, ele nos dizia quais obras, por exemplo, iria fazer e quais não seriam possíveis, pedindo para que indicássemos qual era a prioridade do bairro. E assim conversávamos”, relatou.
O atual prefeito, Samuca Silva, parece não pensar da mesma forma que o seu antecessor. Apesar de estar recebendo alguns dirigentes comunitários, ele não estaria tratando-os com toda “pompa e circunstância” características da gestão Neto. Para Rosana Bergone, que foi alijada da base palaciana, houve um enfraquecimento das Associações no atual governo pela ausência de clareza nas respostas e atitudes. “Acredito que o Samuca tem tentado conversar, mas acho que ele não deve só tentar. Ele deve é focar mais nas Associações de Moradores, pois com o novo OP (Orçamento Participativo), elas enfraqueceram. Há um descontentamento e sei porque vejo alguns presidentes chateados quando converso com eles nas visitas que faço a alguns bairros”, declarou Ber-gone, fazendo a ressalva de que tudo ainda está no início. Mas, ela é clara: espera que melhore.
Bergone acredita que se Samuca adotar uma postura mais objetiva em relação aos líderes comunitários no sentido de oferecer respostas mais diretas e exatas sobre a possibilidade de atender as solicitações, tudo funcionará melhor. “Não vou dizer que o Samuca não conversa. Faz nove meses que ele assumiu. Não vi ainda nenhuma obra dele. Qual é a fala do prefeito? ‘Não tenho dinheiro, peguei uma prefeitura falida, com muitas dívidas e preciso pagá-las para poder começar’. Então, acredito que quando ele começar a pegar esse orçamento e direcionar os presidentes das associações sobre o que será ou não feito, as coisas ficarão mais claras e esses presidentes ficarão mais seguros diante das suas comunidades”, acredita a parlamentar.
Aliás, como vereadora, Rosana tem oferecido assistência aos líderes comunitários no sentido de ouvir as necessidades e cobrar a realização dos serviços. Na quarta, 20, ela levou o projeto “Vereadora Presente” ao Aero Clube para conhecer as reivindicações da comunidade. “Moro no Verde Vale há quase 30 anos. Como vereadora, estou vendo a possibilidade de, junto ao Poder Público, fazer um pouco mais. Não só pelo meu bairro, mas pela cidade. Não tenho dúvida que, como vereadora, posso contribuir e, através da Associação de Moradores, crescer junto a esse trabalho”, afirmou, referindo-se, é claro, a uma possível pré-candidatura em 2018 pelo PRTB.
Já o presidente da Associação de Moradores do Açude (I, II, III e IV), Alan Cunha, eleito com apoio do presidente da Câmara, Sidney Dinho, ainda não se decidiu se só elogia o prefeito Samuca ou lhe mostra a sua frustração. “Temos um bom relacionamento com o prefeito Samuca. Ele tem nos atendido em relação ao que precisamos, mas estamos tentando marcar uma reunião com ele desde o mês de maio (cinco meses, grifo nosso) para que possamos passar as demandas. Não conseguimos ainda. Há um pouco de dificuldade para conversar com ele pessoalmente para passarmos aquilo que a gente precisa”, pontuou.
A reclamação de Alan é que, dos 252 ofícios já protocolados (a maioria relativos a serviços de manutenção), apenas 99 foram atendidos pelo Palácio 17 de Julho. Outra questão levantada por ele diz respeito aos problemas de transporte público. “Já solicitamos à Suser uma fiscalização dos horários de ônibus porque muitos não são cumpridos. A situação foi passada e eles estão sabendo. Eu cobro muito. Fizemos a reunião com eles em junho e, por enquanto, nada foi resolvido, mas espero que seja. Temos esperança”, comentou.
Ex-candidato a vereador pelo PT, Alan Cunha foi eleito presidente da Associação de Moradores graças, entre outras, ao projeto “Açude em ação”, que tem o objetivo de “mudar a cara” da comunidade, tida como uma área violenta. Para isso, diz ele, serão realizados vários programas culturais e sociais para a população do grande Açude. Exemplos desse planejamento são o curso gratuito de pintura imobiliária ministrado pelo professor Luciano Belleti no Ciep Professora Maria de Lourdes Giovanetti e a 1ª Feira de Artesanato Cultural e Talentos, que ocorreu no mês passado. Foi um sucesso.
Até a presidente da FAM (Federação das Associações de Moradores), Fátima Martins, aliada do Palácio 17 de Julho, parece sentir saudade dos anos dourados do governo Neto. “O Samuca tem uma forma diferente de governar. Estamos acompanhando e somos convidados a participar. Algumas vezes, ele já destacou as Associações quanto à importância de seu trabalho. Vejo um foco em regulamentar muitas coisas e isso demanda tempo. Na gestão anterior, trabalhamos bem próximos do governo, com reuniões, valorização e conquistas, apesar de terem ficado algumas coisas por fazer ou terminar. As pessoas são diferentes e agora é observar para que as coisas aconteçam de forma que haja uma periodicidade e nada acumule”, avaliou.
Fátima contou que estão sendo feitas reuniões, a cada 15 dias, entre as associações e a FAM com o vice-prefeito Maycon Abrantes, titular da poderosa Smac, para que os líderes comunitários possam apresentar suas solicitações que serão encaminhadas ao prefeito. O último encontro da série ocorreu na terça, 26. “Estamos fazendo uma série de reuniões por setor. Elas acontecem sempre às 18 horas no auditório da prefeitura. São 12 setores contendo todas as associações. Cada encontro com três setores para tratar de manutenção (lâmpadas queimadas, revitalização de praças, tapa buracos, transporte público etc). Tudo está sendo anotado e encaminhado aos responsáveis para que sejam tomadas providências”, revelou Fátima, completando que será feita uma repescagem das que não puderam comparecer. Afinal, embora não admita, Maycon é pré-candidato a deputado. Federal ou estadual? Só Ele sabe.
Como funciona?
A finalidade da FAM é promover a união das Associações de Moradores e trabalhar pelo encaminhamento das propostas e soluções de problemas, além de buscar, se necessário, a aproximação destas com o Palácio 17 de Julho, conforme definição dada por Fátima Martins, que dirige a entidade há 16 anos. Para se filiar não há custo, apesar de ser estatuário. “Entende-se como federados os que se interessem, comuniquem alterações em sua organização, participem das reuniões quando convocados, tratem sua comunidade com total respeito e estejam presentes para o que se propuseram”, definiu.
A presidente da FAM também lembra o que é preciso para quem estiver interessado em criar uma Associação de Moradores (o município deve ter mais de 100 localidades sem representantes, grifo nosso). “Para criar uma associação, primeiramente é preciso que a comunidade tenha esse desejo. Depois, é necessário construir o estatuto e aprová-lo em uma assembleia específica com edital. Além disso, é preciso eleger o conselho fiscal e a diretoria, que poderá ser aclamada se for única ou com eleição se houver mais chapas. O trabalho das associações é voluntário, portanto, ela não deve ser usada para busca de benefícios pessoais”, afirmou.
Atualmente, segundo Fátima, existem 88 associações em Volta Redonda e a maioria está com representação. Algumas estão funcionando legalmente, outras estão providenciando eleições e outras ainda pensam em desenvolver um novo processo eleitoral, mas fátima assegurou que a FAM está empenhada para garantir a legitimidade e legalidade de todos os seus associados.
Sem taxa
As Associações de Moradores, de qualquer um dos mais de cinco mil municípios brasileiros, não podem exigir taxas de quem não é associado. Essa foi a decisão firmada, em 2015, pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O julgamento ocorreu em virtude dos recursos apresentados por proprietários de imóveis urbanos que, embora não integrassem as entidades, sofreram cobrança das taxas de manutenção relativas às suas unidades e serviços.
Em primeira instância, eles foram condenados a pagar as quantias solicitadas pelas associações pois, no entender do Tribunal de Justiça de São Paulo, seria obrigatória a contribuição mensal, independentemente de inscrição prévia do morador em associação com a justificativa de que a mesma presta serviços comuns que beneficiam a todos. No STJ, entretanto, os moradores conseguiram provar que estaria havendo violação ao direito de livre associação. Os ministros aceitaram os recursos e julgaram como improcedentes as ações de cobrança.