Um levantamento feito pela NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), divulgado recentemente pela grande imprensa, mostrou que a gratuidade nas passagens do transporte público – que beneficiariam idosos, estudantes, deficientes, até categorias especiais de trabalhadores, como policiais e carteiros – tem um forte impacto no preço da tarifa praticado atualmente em todas as cidades brasileiras.
Segundo a NTU, a gratuidade – que é regulada por leis federais, estaduais e municipais – corresponde a 16,7% do preço das passagens de ônibus, em média, no Brasil. O custo é bancado pelos passageiros que pagam sua própria passagem. O presidente da Associação, Otávio Cunha, lembra que a entidade não questiona a necessidade da gratuidade, mas sim quem financia o benefício. E é ele quem avalia que o maior impacto da gratuidade atinge justamente o bolso de quem mais precisa: dos trabalhadores.
Em entrevista ao aQui, o presidente do Sindpass (Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Barra Mansa e Volta Redonda), Paulo Afonso Paiva Arantes, vai além. Afirma que o impacto médio das ‘gratuidade’ no Sul Fluminense e na Costa Verde chega a 25%. “É superior à média nacional”, compara, apresentando um número assustador: as empresas de ônibus registram mais de um milhão e 200 mil ‘passagens gratuitas’ por mês. Detalhe: que de gratuitas não têm nada. “Quem paga a conta da gratuidade é o passageiro que usa os seus reais para andar de ônibus”, pontua. Para ele, o prejuízo dos usuários deveria ser custeado pelo Poder Público.
Como presidente do Sindpass, Paulo Afonso garante que se não houvesse ‘passagem grátis’, a tarifa na região poderia ser reduzida em até 25%.
aQui: O impacto médio das gratuidades no transporte urbano de passageiros no Brasil é da ordem de 16,7%. Qual a estimativa do impacto no Sul Fluminense e na região da Costa Verde?
Paulo Afonso: Cada município possui sua legislação específica, mas atualmente algo em torno de 25% dos passageiros não pagam as passagens nos ônibus das duas regiões citadas. Só para ilustrar: em Volta Redonda são 1.232.671 passagens gratuitas por mês. Já em Paraty, o número das pessoas que teoricamente andam de graça chega aos 54.897 todo mês.
aQui: Algumas empresas da região dizem que a tarifa poderia ser 15% mais barata se houvesse mudanças nas gratuidades concedidas. Qual a estimativa do Sindpass para a redução do preço da passagem se ocorresse mudanças no custeio das gratuidades no Sul Fluminense e na Costa Verde?
Paulo Afonso: Se houvesse a possibilidade do custeio pelo Poder Público de todas as passagens gratuitas haveria uma redução das tarifas em 25%. Exemplo: se a passagem custa R$ 10,00 e se o universo das pessoas que andam de ônibus chegasse a 10.000, somente 8.000 estariam pagando para andar de ônibus. Ou seja, 2.000 passageiros estariam andando ‘de graça’. Se essas 2.000 pessoas começassem a pagar para andar de ônibus a tarifa poderia ser reduzida de R$ 10,00 para R$ 8,00.
Veja abaixo o cálculo que fizemos para ilustrar a resposta:
8.000 x R$ 10,00 = R$ 80.000,00
2.000 x R$ 0,00 = R$ 0,00
Total das receitas do sistema = R$ 80.000,00
Com todos pagando passagem: 10.000 x 8,00 = R$ 80.000,00
Ou seja, quanto maior a quantidade de pessoas pagando passagens menor seria a tarifa.
aQui: Quem utiliza mais as gratuidades tanto no Sul Fluminense quanto na Costa Verde?
Paulo Afonso: Os idosos aparecem em primeiro lugar com 56%, seguido dos estudantes com 25%. Temos ainda um bom número de gratuidades referentes a deficientes físicos e mentais, portadores de doenças crônicas e também de acompanhantes que chegam a 14% das passagens gratuitas.
aQui: Em média, quantos passageiros por dia são transportados gratuitamente no Sul Fluminense e na Costa Verde?
Paulo Afonso: São em torno de 86.000 passagens gratuitas por dia
aQui: Qual o custo mensal dessa gratuidade?
Paulo Afonso: Da ordem de R$ 9.380.000,00 por mês.
aQui: Quem banca essa gratuidade toda?
Paulo Afonso: Não existe custeio das gratuidades nas duas regiões. Deveria, mas não existe. Assim, quem paga para alguém teoricamente ‘andar de graça’ nos ônibus de Volta Redonda, Barra Mansa, Angra dos Reis, Paraty e demais cidades é o próprio passageiro, aquele que entra e paga sua passagem. Paga a dele e uma parte de outro passageiro.
aQui: Que mudanças o Sindpass apoiaria em relação à gratuidade, tanto em relação ao financiamento quanto ao público atendido?
Paulo Afonso: Apoiaria o financiamento das gratuidades pelo Poder Público, passando a responsabilidade das passagens gratuitas às prefeituras, ao Estado, ou se for o caso, à União. A lei deveria determinar a responsabilidade a um deles. Seria mais justo, ao invés de uma parte dos passageiros pagar para outra boa parte ‘andar de graça’.
aQui: Quais os principais pontos negativos que o Sindpass aponta no atual sistema do transporte de passageiros nas duas regiões?
Paulo Afonso: São vários, mas destacamos os seguintes:
1- Pela ausência do Poder Público, que não se responsabiliza pelo custeio das gratuidades, a passagem é rateada entre aqueles que pagam para andar de ônibus, ou seja, o custo dos que não pagam é embutido na tarifa dos que pagam.
2 – Existem várias pessoas que ‘andam de graça’ e poderiam pagar a tarifa. Exemplo: um idoso de 65 anos, que possui automóvel e que reside em casa própria, tendo renda mensal acima de 10 salários mínimos poderia, muito bem, quando for se deslocar utilizar o transporte público, pagar a sua passagem. Hoje, muitos deixam o carro em casa e pegam o ‘ônibus de graça’ para fazer serviços para terceiros, como ir ao banco etc.
3 – Não existe prioridade para o transporte coletivo em relação ao individual (carro e motocicletas). Na maioria das cidades da região ainda não há, por parte do Poder Público, essa prioridade para o transporte de passageiros. Na maioria não existe faixas exclusivas para os ônibus e quando elas existem, falta fiscalização.
aQui: Muitos prefeitos da região andam falando em promover mudanças no transporte de passageiros, em fazer novas licitações, em colocar ônibus gratuitos para determinados grupos em detrimento da maioria dos que pagam passagens, etc. O que o senhor teria a dizer a esses governantes?
Paulo Afonso: Entendemos que mudar o nome da empresa não resolve a questão do transporte coletivo. O que se faz necessário, a nosso ver, é que o serviço tem que ser feito com racionalidade, eficiência e, acima de tudo, baseado na técnica. Se assim for, o Poder Público terá como cobrar mais eficiência dos serviços, qualidade e tarifas justas.