Há cerca de 10 dias, um homem pulou nas águas do Rio Paraíba na altura da Ponte dos Arcos, em Barra Mansa. Na semana anterior, outro homem também já havia pulado da mesma ponte. Ambos não fugiam de criminosos, nem da Polícia. Quando seus corpos foram retirados do rio, não foram encontradas marcas de violência. Eles tinham cometido suicídio e engrossaram a triste estatística que, infelizmente, cresce a cada ano. Segundo a Organização Mundial de Saúde, a cada 40 segundos, uma pessoa se suicida no mundo. No Brasil, o Ministério da Saúde calcula que 32 brasileiros tiram a própria vida todos os dias. Mostra que a realidade não pode ser ignorada e o enfrentamento ao suicídio tem que ser urgente.
Embora as autoridades garantam que o suicídio é uma das causas de mortes que mais crescem no Brasil, as estatísticas não estão disponíveis para qualquer cidadão. O acesso ao Sistema Nacional de Mortalidade (SIM), que integra o domínio gov.br, é restrito. Não é possível extrair relatórios por região do país, apenas os dados municipais são acessados, mesmo assim, por funcionários das secretarias de Saúde autorizados pelo sistema. Das informações abertas, um dado chama a atenção: a maior incidência de suicídios ocorre na faixa etária dos 15 aos 29 anos.
Sim, os jovens são os que mais tiram a própria vida no Brasil. E, dentre eles, a maioria é de homens. Em 2019, meses antes da pandemia estourar, o SIM divulgou sua triste estatística: 13.520 suicídios no país. O número é 30% maior do que 10 anos antes, quando a média de suicídios era de 4,95 por 100 mil habitantes,bcontra 6,42/100 mil em 2019. Depois disso, não houve novas estatísticas do SIM, mas as campanhas de proteção à vida mais que triplicaram. O marco importante foi a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências, criada em 2001 e que incluiu a temática do suicídio.
No calendário do SUS, setembro é o mês em que as prefeituras lembram do assunto e promovem campanhas de prevenção ao suicídio. A data exata para o chamado ‘dia D’ é 10 de setembro. Mas o tema é trabalhado durante todo o ano, justamente porque os números são alarmantes. Em geral, os ambulatórios de Saúde Mental concentram os atendimentos, porque entende-se que a saúde mental negligenciada é um determinante para o suicídio.
Projeto de Lei
Prova de que o trabalho de conscientização e enfrentamento ao suicídio acontece durante todo o ano é o projeto de lei (n° 616/ 23), aprovado na Alerj, que cria o Programa de Saúde Mental, Prevenção de Depressão e Suicídio, para atendimento psicológico on- line de pais e cuidadores de pessoas com deficiência. O texto já está nas mãos do governador Cláudio Castro para sanção ou veto. Se for sancionado, vai atender uma demanda significativa de pais e cuidadores de PCDs em todo o estado do Rio. Este grupo terá direito ao atendimento psicológico on- line, com a finalidade de evitar o adoecimento mental e, posteriormente, pensamentos suicidas.
O PL é de autoriade Índia Armelau (PL) e Fred Pacheco (PMN), mas outros seis parlamentares assinaram o documento como coautores. Dentre eles, Jari de Oliveira, de Volta Redonda. A norma estabelece que os benefícios do programa sejam oferecidos aos pais e cuidadores cuja renda familiar mensal não ultrapasse três salários mínimos. Já a implementação do programa deverá acontecer através de convênios, parcerias com organizações não governamentais, universidades, instituições de ensino públicas e privadas, órgãos governamentais e demais setores da sociedade civil.
Pelo texto do PL, o Executivo poderá criar um aplicativo de celular gratuito, de fácil visualização e com recurso de tecnologia assistiva, para oferecer atendimento psicológico por videoconferência. O agendamento deverá ser realizado diretamente no aplicativo. Além disto, os protocolos do programa deverão ser desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar formada por psicólogos, terapeutas e assistentes sociais, sem prejuízo de outros profissionais que se fizerem necessários à implementação do programa. “O objetivo é oferecer suporte psicológico aos pais e cuidadores de PCDs, visando uma intervenção precoce para acolher, reduzir os impactos de negação ou dificuldade de aceitação, fortalecer os laços familiares através de informação qualificada acerca da deficiência e diminuindo o estresse dos pais ou cuidadores diretos”, explica Índia Armelau.
Segundo o aQui apurou, não há dados específicos da incidência de suicídios entre cuidadores e pais de pessoas com deficiência no Brasil, mas há evidências de que essa população enfrenta muitos desafios e dificuldades, como falta de apoio, sobrecarga emocional, estresse, isolamento social, discriminação e violência. Para os parlamentares que assinam o PL, “estes fatores podem aumentar o risco de desenvolver transtornos mentais, como depressão e ansiedade”, considerados determinantes para o suicídio. Além disso, a implantação do programa vai contribuir para a criação de um banco de dados com estatísticas específicas sobre o assunto.
Outro ponto interessante do PL é que, se sancionado, o atendimento previsto no texto vai integrar a linha de cuidado à saúde da pessoa com deficiência, ainda que a questão esteja voltada aos pais e tutores e não aos próprios PCDs. Isto será possível porque, uma vez que a pessoa com deficiência é atendida na rede pública de saúde, os sistemas de informação poderão trazer o nome do responsável por aquele PCD, oferecendo, assim, o suporte psicológico necessário que este tutor precisar.
O governador Cláudio Castro tem 15 dias para decidir se aprova ou não o projeto de lei. Seja como for, há outras instituições que também oferecem acolhimento e assistência a qualquer pessoa que precise de um atendimento psicológico voltado à prevenção do suicídio. Uma delas é o Centro de Valorização da Vida (CVV), que possui uma linha direta através do número 188. Qualquer pessoa que sentir que precisa de apoio emocional ou perceber sinais de depressão pode fazer contato com este número. O atendimento é feito por voluntários treinados e é baseado no princípio do sigilo e do respeito à privacidade de quem procura ajuda.