Por Pollyanna Xavier
Semana passada, Maria* foi ameaçada e agredida verbalmente por um vizinho com palavrões impublicáveis. Ela foi até a Delegacia de Polícia, no Aterrado, e questionou se deveria ser atendida na Deam, delegacia especializada no atendimento à mulher, que funciona no segundo andar da 93a DP, em um espaço que conta com salas de acolhimento, assistência psicológica, banheiros, copa e até uma pequena brinquedoteca. O ambiente foi planejado para que a mulher se sinta segura para denunciar toda forma de violência sofrida, seja verbal, física, emocional, racial, homofóbica, transfóbica, misógina, doméstica etc. Mas, na prática, nem sempre a mulher consegue acesso à estrutura.
Maria*, por exemplo, não conseguiu nem subir para registrar os crimes de injúria e difamação dos quais foi vítima. O funcionário do balcão disse que aquele tipo de ocorrência só seria registrado na Deam se o agressor tivesse algum relacionamento passional com ela – namorado, marido, companheiro, atual ou ex –, o que não era o caso. Caso contrário – e, se ela quisesse esperar sua vez, entre todas as inúmeras demandas do dia –, seria ali mesmo, no balcão da DP, diante de um monte de homens sem treinamento técnico para esse tipo de atendimento. Maria*, é claro, voltou para casa e fez o registro da ocorrência de forma on-line, mas decidiu procurar o jornal com a seguinte questão: “A Deam de Volta Redonda só atende vítimas da Lei Maria da Penha? Outras violações aos direitos da mulher ou mesmo crimes contra a honra feminina não são casos da Deam?”, questionou.
Foi em cima da polêmica que o aQui procurou a delegada Juliana Montes, titular da Deam de Volta Redonda, que estranhou o caso. Segundo ela, existe um procedimento padrão para que todas as ocorrências que envolvam mulheres sejam direcionadas ao segundo andar. Exceto registros de furto ou roubo de celular, que são considerados crime contra o patrimônio, e não contra a vida. “Isto que você relatou é o oposto do que praticamos aqui, e o pessoal lá de baixo sabe disso. Ela podia ter subido e registrado aqui. Com certeza, seria acolhida”, garantiu Juliana, acrescentando que a Deam não atende apenas os crimes previstos na Lei Maria da Penha, mas qualquer outro em que a mulher seja vítima.
Juliana foi além. Disse que a 93a DP é uma delegacia muito agitada, com grande movimentação de pessoas e com número considerável de registros de ocorrência/dia, o que faz com que os próprios funcionários direcionem para a Deam as ocorrências das quais as vítimas sejam mulheres. “Isto acontece não só porque é protocolo, mas também porque desafoga o serviço deles”, comentou. “Independentemente se o agressor tem alguma ligação, se a mulher é vítima de qualquer forma de violência, o atendimento é feito pela Deam”, garante.
O atendimento, de acordo com Juliana, é especializado mesmo. As mulheres, inclusive as trans, são acolhidas por uma psicóloga cedida pela prefeitura de Volta Redonda, que está disponível na Deam durante a semana, oito horas por dia. Se a mulher estiver acompanhada do filho menor, a criança é colocada na brinquedoteca, para que a mãe consiga falar com privacidade. “Isto evita revitimização, porque se essa mulher sofreu uma violência doméstica, as chances da criança ter assistido a agressão são grandes. Então, para não revitimizar o filho, ele fica brincando enquanto a mãe é atendida”, explicou.
Ainda de acordo com Juliana, a média de atendimentos/dia na Deam é de oito ocorrências. Os casos vão desde as violações da Lei Maria da Penha até briga de vizinhos com ameaça, semelhante à que Maria* foi vítima. O caso dela, inclusive, já está sendo investigado pela equipe de Juliana, que deixou bem claro ao aQui que a Deam está aberta às mulheres. Todas elas, sem exceção. Então tá.
* o nome foi modificado para preservar a vítima.