Por Pollyanna Xavier
A novela Vita não acabou. Nos bastidores, as movimentações continuam rendendo bons capítulos. Essa semana, o aQui conversou, com exclusividade, com Ruy Muniz, sócio controlador do grupo Soebras – que comprou o Vita há 10 dias antes de ser despejado por ordem da Justiça. Ruy vive em Minas Gerais e por telefone deu detalhes de como ocorreu a negociação do maior hospital particular de Volta Redonda. Por cerca de 30 minutos, ele fez declarações reveladoras e criticou a sentença que culminou com a desmobilização do Hospital. “O juiz transformou uma simples ação de despejo em uma ação complexa de expropriação e intervenção. Houve arbitrariedade judicial”, reclamou.
Ruy Muniz é empresário e político, polêmico, inclusive. No primeiro papel é responsável pela gestão de diversas empresas, dentre elas escolas, universidades e hospitais. No segundo, é um articulador arguto. Sabe onde pisa. “A CSN é a grande causadora do problema”, disparou. “Mas estamos negociando com a empresa. Eu acho que resolver as coisas de forma administrativa ainda é o melhor caminho. Não somos intransigentes”, disse, acrescentando que tem conversado com os advogados da CSN sobre a dívida do Vita e um possível pagamento de aluguel pelo imóvel. “Nossa proposta já foi feita, mas a negociação mais pesada é com a CSN”, admitiu.
Para Ruy, a decisão que culminou com o despejo e a gestão por parte do Centro Médico não é o fim da ação judicial. E lembra que o TJ-RJ e o STJ, em Brasília, julgaram apenas recursos da ação, e não a ação propriamente dita. Com base nisto, Ruy acredita que o Vita vai conseguir reformar a decisão de 1ª instância e, pasmem, exigir da CSN uma indenização milionária pelo que ele chamou de “apropriação indébita” do ‘fundo de comércio’ do Vita, e de todos os bens que pertenceram ao grupo paulista e que hoje seriam da Soebras. “No final das contas vamos ser indenizados pela CSN em milhões e milhões de reais”, crê.
Despejo e Interventor
Sobre a decisão de despejo da unidade Vita, em Volta Redonda, Ruy disse que não conseguiu entender os passos do juiz Roberto dos Reis. Apesar de não ter citado o nome do magistrado, Ruy criticou duramente suas decisões. “A ação de despejo vinha acumulada com cobrança de aluguel. O juiz conseguiu transformar isto em algo enorme. Pra ele pareceu mais fácil criar um interventor a peso de ouro do que despejar o Vita, retirar os equipamentos para outro local e liberar o prédio para a CSN. Era simples, mas complicaram”, reclamou. Sobre o interventor, as críticas foram ainda mais pesadas.
Segundo Ruy Muniz, o juiz, ao sugerir a figura de um interventor, propôs um honorário de R$ 2,4 milhões custeado pela CSN e pelo Vita. Como o valor não teria sido aceito pelo Vita, o juiz baixou para R$ 1,8 milhão. “Isto foi absurdo. A CSN e o Vita ficaram de pagar, meio a meio, os honorários deste interventor. O Vita não concordou com isto. Este interventor assumiu uma gestão e teve uma ideia de jerico de criar uma empresa com centenas de médicos. Esses médicos são verdadeiros laranjas do interventor e da CSN”, acusou. “O que eles estão governando? É dinheiro deles? Pra mim é uma apropriação indébita dos valores e investimentos do Vita”, avaliou. “Abuso de autoridade”, emendou.
Penhora e fundo de comércio
Provocado a falar sobre a penhora dos bens do Vita como forma de pagar a dívida com a CSN, Ruy Muniz disse que o que o juiz fez não configura penhora. “Penhorar para pagar um débito é uma coisa. O que o juiz fez foi arrancar um alvará de uma empresa e dar para outra. Isto não existe. Como pode? Como pode a Vigilância Sanitária ter cancelado um alvará de uma empresa que não tem pendência sanitária e dar para outra empresa? Isto é arbitrário. Foi uma sucessão de decisões arbitrárias. O juiz local deu uma sentença que a gente não concorda. Ele determinou o afastamento do Vita para que o Centro Médico assumisse. Isto não existe. A CSN tem conseguido uma série de sentenças locais absurdas”, dispara.
Quanto ao ‘fundo de comércio’ (como o que uma loja cobra para passar o ponto, grifo nosso), Ruy disse que ele existe e pertence – atualmente – ao Soebras. Questionado sobre a postura da Justiça, de não reconhecer o ativo, Ruy disse que as decisões jurídicas tomada até então foram arbitrárias. “Me impressiona isto. Até a imprensa divulga isto como se fosse algo normal. Não é. Só vejo arbitrariedade e abuso de poder. Está havendo um desrespeito às leis. Mas eu ainda espero que esta situação caia nas mãos de um juiz justo que julgue com imparcialidade e sem arbitrariedade. A guerra jurídica ainda não acabou”, anuncia.
Compra do Vita
Durante a entrevista ao aQui, Ruy Muniz explicou como se deu a transação para a compra do Hospital Vita. “Não houve transferência de valores”, adiantou, explicando que a negociação foi consumada e que o ativo e o passivo do Vita passaram a pertencer ao Soebras. “Compramos um hospital avaliado em R$ 130 milhões, com dívidas que também beiram R$ 130 milhões, ou seja, nos comprometemos a pagar todo o passivo em troca do ativo”, explicou. Destes R$130 milhões, Ruy disse que cerca de R$ 60 milhões referem-se à dívida com a CSN, o restante estaria dividido entre passivos trabalhistas, ambientais e outros tipos de indenizações judiciais.
“Nós compramos o Vita pelo passivo dele. Trocamos o ativo pelo passivo. Temos 100% das ações do Vita e como donos do fundo de comércio e de tudo o que está dentro do prédio do hospital, queremos pagar nossas dívidas e gerir o ativo”, ressaltou. Ainda de acordo com Ruy, o capital do Vita está avaliado em R$ 8 milhões (a marca). “Este capital é o que chamamos de ‘marca’. Somos os donos do capital, somos os donos da marca”, explicou.
Outro detalhe na matemática de Ruy é que, com a dívida de R$ 60 milhões com a CSN e o ativo avaliado em R$ 130 milhões, restariam outros R$ 70 milhões para quitar os demais passivos do Vita e zerar todas as pendências financeiras adquiridas ao longo dos anos. “Começaríamos do zero”, avalia.
Gestão pelo Centro Médico
Outra questão bastante criticada por Ruy Muniz foi sobre a gestão do hospital pelo Centro Médico. Ele lamentou o fato de o juiz não autorizar a presença de um representante do Soebras no hospital e lembrou que a atual gestão é provisória: tem prazo de apenas quatro meses, podendo ser prorrogada conforme decisão da CSN. “O Centro Médico não tem capital e nem know-how para gerir um ativo como o hospital. Eles estão lá porque se apropriaram indevidamente de um capital que nunca lhes pertenceu. O dinheiro não é deles, o capital não é deles. Os médicos assumiram por quatro meses, e depois? Se a CSN anunciar novo gestor, terão que sair de lá como entraram: sem nada”, avaliou, esquecendo-se que ele também, como gestor do Soebras, terá que enfrentar a CSN na Justiça caso queira gerir o hospital.
Em todo o tempo, ao se referir ao Hospital, Ruy citou o nome dado pelo Soebras: Hospital Santa Cecília, e disse não reconhecer o atual nome dado pelo Centro Médico: Hospital das Clínicas de Volta Redonda. Segundo ele, não há pendências salariais com os médicos e demais funcionários. “Estamos em dia com todos os salários. Os do mês de julho ainda não foram pagos e caberá ao Centro Médico este pagamento até o quinto dia útil de agosto”, explicou.
A informação, porém, não bate. É que vários médicos procurados pelo aQui contaram que o Vita ainda não teria depositado os salários de junho. “É o caso de médicos plantonistas”, explica um deles. Tem mais. Médicos que atendem clientes dos planos de Saúde através do Vita não estariam recebendo os repasses. “O Centro Médico está em dia com seus médicos, mas o Vita não. Ele só paga quando recebe dos planos de Saúde e isto demora de 3 a 4 meses. Recebemos o mês de março, mas não sabemos se vamos receber os demais meses, não”, revelou um deles. “A maioria aposta em um calote do Vita”, avalia.
Histórico
A CSN move a ação por inadimplemento e cobrança de aluguel contra o Hospital Vita desde 2014. A primeira decisão, naquele ano, determinou pelo despejo do Hospital. Os recursos apresentados no Tribunal de Justiça só serviram para postergar o problema, nunca para saná-lo. Em fevereiro deste ano, mais uma decisão de despejo deu o pontapé para um imbróglio que se arrastou até o final de junho. No dia 30 de junho ocorreu o despejo. Na prática mudou-se apenas o CNPJ, porque os atendimentos continuam normais – com qualidade e excelência.
O Hospital Vita saiu de Volta Redonda deixando pra trás uma dívida de R$ 60 milhões só com a CSN. Fora os passivos trabalhistas. Uma informação de um dos advogados do Centro Médico dá conta que o valor apurado para pagar a dívida do Vita com funcionários, fornecedores e médicos teria sido depositado em juízo. E isto inclui as rescisões trabalhistas dos ex-funcionários do Vita. “À medida que eles forem entrando na Justiça para receber seus direitos, o juiz vai mandando pagar”, explicou. Ruy não comentou a questão.