Por Manu Porfírio
O alerta de que Volta Redonda teria um dia diferente na terça, 16, foi dado pela secretaria de Comunicação do Palácio 17 de Julho, no dia anterior. Em nota aos jornais, a Secom informava que, a pedido da Polícia Federal, o trânsito em frente à sua sede, no Aterrado, seria fechado ao público. Isso não ocorreu. Não deu outra. Na manhã de terça, por volta das 6 horas, dezenas de viaturas e centenas de agentes passaram a sair para cumprir mandados de busca. E voltavam sempre cheias.
Por volta das 11 horas, o Viaduto Heitor Leite Franco, em frente à sede da Polícia Federal, estava abarrotado de curiosos ou parentes dos presos em busca de imagens para as redes sociais e notícias dos cerca de 100 presos – 88 para ser exato, sendo que 25 deles eram integrantes do 28º Batalhão da Polícia Militar. O número equivale a 5% do efetivo da unidade, composto por 670 homens.
Durante as investigações, que duraram dois anos, 32 PMs do 28° a BPM, entre soldados, cabos e sargentos, teriam participado de um grande esquema de corrupção. Eles recebiam caixinhas que variavam de R$ 500 a R$ 2 mil, por semana, para fazer vista grossa – e não combater – às ações dos traficantes da região, que seriam ligados a uma facção criminosa do Rio de Janeiro.
Segundo o promotor do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, Fabiano Cossermeli, 650 agentes de três forças policiais – Federal, Civil e PM – cumpriram 102 mandados de prisão, sendo 32 PMs do 28° BPM e 70 civis. Sete PMs, que estariam de férias, não foram presos e não tinham se apresentado à corporação até o fim da noite de terça, 16. Na operação, foram apreendidas drogas, munições, e 472,5 mil bolivares venezuelanos (R$ 27,8 mil), cuja origem será investigada. O dinheiro estava na casa de um dos alvos da operação, ainda não localizado, que mora no bairro Jardim Aliança, em Resende. Também foram apreendidos um tablete de maconha, 65 trouxinhas da mesma droga, 129 pinos de cocaína, 420 pinos grandes de droga, entre outros.
Se dependesse da Polícia Federal, da Polícia Civil, da PM e do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), o número de presos seria maior, pois os agentes saíram em campo para – fruto das operações ‘Síderos’, ‘Confinados’ e ‘Corrupsius’ – cumprir 100 mandados de prisão e 191 mandatos de busca e apreensão, contra 32 PMs, 57 traficantes de Volta Redonda e outros 13 – também ligados ao tráfico – em Itatiaia e Resende. Os PMs e os bandidos são acusados de corrupção passiva, roubo, tráfico de drogas e associação criminosa armada, dentre outros crimes.
De acordo com o promotor da Gaeco, Fabiano Oliveira, a Síderos, a Confinados e a Corrupsius acabaram se tornando apenas uma, pois todas teriam o mesmo ponto em comum: eliminar o tráfico de drogas no Sul Fluminense. “Em linhas gerais, os trabalhos foram iniciados para apurar o tráfico de drogas, inicialmente em Volta Redonda e, posteriormente, em Itatiaia, Resende e outras localidades. A partir do avanço das investigações identificamos a presença de alguns agentes pú-blicos (PMs) envolvidos na corrupção”, relatou.
O comandante do 28º BPM, Júlio César Veras, foi além. Ao aQui, ele contou que com a prisão dos ‘cabeças de chave’ da operação – cujos nomes não foram revelados -, a força do grupo será enfraquecida. “Esse trabalho (tráfico) é das lideranças que estão presas (Complexo de Gericionó, no Rio), justamente com os seus comparsas que estão soltos. E, sobretudo, (a prisão) dos agentes públicos envolvidos foi fundamental para desbaratar a quadrilha. Temos certeza que isso vai causar um impacto positivo daqui para frente”, disse o oficial da PM.
Ainda de acordo com o tenente-coronel Júlio César Veras, se for comprovada a participação dos PMs presos no envolvimento com o tráfico de drogas, eles serão expulsos da corporação. “Continuaremos com as investigações mesmo que a PM tenha novamente que cortar na própria carne”, garantiu.
O Comandante do 5° Comando da Área (5° CPA), coronel Antônio Jorge Goulart Matos, que também estava em Volta Redonda, disse que os valores das propinas seriam de R$ 500 a R$ 5 mil. “Os acertos eram periódicos, semanais ou quinzenais”, disse, adiantando que a investigação só foi possível devido à integração entre os Policiais Militares e o Ministério Público, que tinham o objetivo de retirar de circulação traficantes e agentes associados ao tráfico. “Esses agentes presos trabalhavam a metade do tempo para a Polícia Militar e a outra parte para eles mesmos, trazendo malefícios para os moradores. Espero que essa ação possa trazer mais tranquilidade, segurança e dias melhores à população do Sul Fluminense. A prisão dos PMs foragidos é uma questão de tempo”, avaliou.
A atuação dos criminosos teria Volta Redonda como ponto central, mas segundo Pedro Paulo, delegado da Polícia Federal, o comando da organização agia bem longe da cidade do aço. Tudo estaria sendo organizado em Resende. “O comando da organização está situado no bairro Cidade Alegria, em Resende”, disparou, indo além: “O ‘modus operandi’ era adquirir a droga em Resende e vender no bairro Siderlândia, em Volta Redonda. Muito provavelmente essa droga vinha do interior de São Paulo, onde nós já constatamos em outras investigações, inclusive, em operações que organizamos há nove ou dez anos atrás” disse.
Com a prisão dos PMs e a redução do número de policiais nas ruas, o promotor do Gaeco, Fabiano Oliveira, afirmou ao aQui que, na visão dele, a redução não vai gerar riscos à população. “Eu acredito que não haverá um risco porque naturalmente o comando da PM, que participou ativamente da operação, tem dimensão dessa realidade e vai se incumbir de fazer a reposição e a realocação dos policiais para cobrir toda a demanda. Isso é natural. O próprio comando (da PM) está participando da operação. Isso (a prisão dos PMs) não é uma operação feita contra a Polícia Militar, muito pelo contrário, é uma operação feita pela Polícia Militar e eles têm consciência dessa realidade”, pontuou, certo de que o apoio necessário para que as medidas (reposição dos afastados) sejam tomadas deve sair da própria PM. “A Polícia Militar tem condições de redistribuir seus efetivos, de alterar suas escalas para preencher todas as lacunas”, disse.
Julio César Vegas concorda. “O Estado Maior da corporação certamente, por conta dessa ação, vai remanejar policiais de outras unidades para completar (a do 28º) e podem ter certeza: o policiamento na região não será afetado”, garantiu ao falar com o aQui.
Aproveitando a deixa, o promotor da Gaeco garante que a apreensão dos PMs foi importante por ter desmontado as peças-chave da organi-zação criminosa. “Na verdade, a razão oficial da criminalidade, do tráfico em especial, é a corrupção. Não há crime que se sustente de forma organizada sem a participação de agentes corruptos, então essa é a ligação que liga esses núcleos”, avaliou.
Política
Ainda na coletiva, o promotor Fabiano Oliveira informou que uma candidata a deputada federal, que seria uma pastora do PPS, acabou envolvida. Segundo ele, o traficante que seria o chefe do esquema, conhecido como ‘Maninho’, estaria de dentro do presídio de Gericionó determinando que seus subordinados pedissem votos para a candidata. “Não há interceptação dessa candidata, há uma menção do líder da organização criminosa de dentro do presídio, determinando aos seus subordinados aqui fora que promovessem a reunião de votos, na casa de quatro a cinco mil para essa candidata”, revelou.