Que o prefeito Samuca Silva é um cara audacioso, todo mundo já sabe: comprou o Hospital Santa Margarida, está tentando comprar o Escritório Central, arrumou duas ‘tretas’: uma com o maior peso pesado da política no Sul Fluminense, o ex-prefeito Neto, do MDB; outra, com um dos maiores craques do futebol brasileiro, o senador Romário, do Podemos, e por aí vai. Para não perder o costume, agora Samuca resolveu se envolver em mais uma pendenga: quer contratar uma das mal afamadas OSs (Organizações Sociais) para gerenciar os hospitais do Retiro e do São João Batista – sendo este último o maior da região.
O passado recente das OSs no estado do Rio são os piores possíveis: em Barra Mansa, no governo Jonas Marins, uma delas – a OS Geração Saúde – foi responsável pelo fim político do prefeito comunista. Só faltou ser preso. Pior. A OS ‘foi-se de Barra Mansa’ devendo os salários de dezembro e o 13º dos funcionários da Saúde. Literalmente, pode-se dizer que ganhou um ‘passa fora’ assim que o atual prefeito, Rodrigo Drable, assumiu o cargo.
Esta semana, inclusive, a secretaria estadual de Saúde rescindiu o contrato com a OS Hospital Maternidade Therezinha de Jesus (HMTJ), que gerenciava as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Jacarepaguá, Botafogo, Copacabana e Tijuca, no Rio, além do Hospital da Mãe, em Mesquita, na Baixada Flumi-nense. Motivo: a OS não estaria pagando os funcionários, embora tenha recebido os repasses de verba feitos pelo governo do Estado, além de, teoricamente, estar acatando recomendações da Defensoria Pública, e, principalmente, devido a denúncias de funcionários e greves.
A OS chegou a se defender afirmando que o Estado estaria repassando “o mínimo para o funcionamento das unidades”, e garantiu ainda que uma dívida de R$ 500 milhões teria sido gerada por conta da irregularidade dos repasses.
De boas
O fracasso das OSs não incomoda Samuca, que chegou, em campanha, a falar mal das empresas de Saúde, tanto que ele está mesmo disposto a bancar a briga das impopulares OSs. Em entrevista ao programa Fato Popular, da Rádio 88 FM, do radialista Betinho Albertassi, Samuca garante que as OSs são a saída para desafogar a folha de pagamento da Saúde, dando fôlego para a prefeitura investir recursos em outras áreas, como Educação.
“No Hospital São João Batista e no Hospital do Retiro temos alguns problemas graves, como a manutenção – o ar condicionado funciona 24 horas, assim como as lâmpadas – que precisam de uma resposta, e na administração pública temos o problema da licitação. Às vezes é um fato imprevisível, e você não pode comprar rápido. Outro problema é a questão do pessoal. Com a Lei de Responsabilidade Fiscal você tem um limite de gastos (54% da arrecadação, grifo nosso), e a OS liberaria um fluxo de pessoal. Eu poderia investir na Guarda Municipal, na própria Saúde de Volta Redonda, na Educação, onde temos defasagem de professores”, argumentou Samuca, afirmando ainda que vai exigir “auditorias e uma melhora constante no atendimento da Saúde de Volta Redonda”.
O prefeito também salientou que as OS só funcionariam nos dois hospitais públicos municipais. “Cais Aterrado, Cais Conforto, Policlínica da Cidadania, enfim, todas as unidades da Saúde da Família, isso tudo continua como está”, disse Samuca, procurando tranquilizar ainda os profissionais da Saúde. “Não haverá qualquer tipo de demissão em massa, pelo contrário, vocês que estão aí na ponta serão absorvidos”, prometeu.
Samuca citou ainda o peso dos mais de 3,5 mil contratados por RPA (Recibo de Pagamento a Autônomo) na Saúde de Volta Redonda, alguns há mais de 20 anos, e que não gozam de nenhum direito trabalhista. E mais uma vez, mostra toda a sua coragem: “Uma questão que ninguém quis enfrentar, e nós estamos colocando o dedo na ferida nessa questão de OS”, comparou, referindo-se certamente ao ex-prefeito Neto, conhecido por manter milhares de RPAs em vários locais do serviço público. E que também sempre atacou as OSs, que não queria ver nem pintadas de ouro.
“Se fosse outro prefeito (Neto?, grifo nosso)…essa questão da OS foi muito mal debatida no estado do Rio de Janeiro, sob o ponto de vista de “ah, é antipopular”. Mas nós fomos até São Paulo, pegamos o melhor modelo e estamos aplicando em Volta Redonda”, argumentou Samuca, dizendo ainda que fará “auditorias regulares, com metas, indicadores”, e que o conselho municipal de Saúde vai participar “ativamente das auditorias”.
No olho dos outros
Mas, se por um lado Samuca acredita piamente que as OSs são a salvação para a Saúde de Volta Redonda, ele parece não levar tanta fé assim nas OSs dos outros. Mais especificamente, na baiana OS Instituto Marrie Pierre, que foi contratada pelo governo do Estado – por R$ 3,5 milhões mensais – para gerenciar parte dos leitos e outros serviços do Hospital Regional, que passaram a funcionar desde segunda, 2.
“É um hospital que, se der errado, vai influenciar na Saúde de Volta Redonda, porque está localizado na cidade de Volta Redonda. Por isso eu tenho cobrado muito dos governantes. Inclusive hoje (terça, 3) tem uma reunião técnica entre a empresa que vai administrar o Hospital Regional e a secretaria municipal de Saúde, até para debater esse protocolo de atendimento. Por exemplo, em uma falta de energia no Hospital Regional, vai (levar pacientes) para qual hospital?”, detalhou Samuca na entrevista a Betinho Albertassi.
Samuca está tão decidido que anunciou no programa Fato Popular que as OSs devem começar a trabalhar já em maio. “O próximo passo – nós tivemos três OSs credenciadas, se não me falha a memória – é essas empresas participarem da licitação, que deve acontecer nos próximos dias”, justificou, garantindo que a prefeitura está exigindo todas as “documentações que inibem a prática de empresas que não querem o bem de Volta Redonda”.
Antes de encerrar a entrevista, Samuca pediu um voto de confiança da população sobre a questão das OSs, garantindo que a contratação das empresas vai melhorar muita coisa na cidade. “Confie no seu prefeito, nesse prefeito que já deu mostras de controle, de auditoria, de participação, mas confie também que nós precisamos regularizar do PCCS do servidor público, do aumento que estamos engessados, e essa contratação da OS vai dar um fluxo financeiro que vamos poder avançar em outras áreas”, justificou. Então, confiemos.
Dividindo responsabilidades
O prefeito Samuca Silva se reuniu na manhã de quarta, 4, com os membros do Conselho Municipal da Saúde justamente para tratar da licitação que fará para contratar uma OS (Organização Social) que ficará responsável pela gestão dos hospitais da rede municipal. Abordou ainda a situação do Hospital do Idoso, que funciona em um imóvel alugado pelo Palácio 17 de Julho.
E Samuca deixou claro que, em relação aos Hospitais São João Batista e do Retiro, o Conselho Municipal de Saúde deverá ser atuante, tendo voz ativa em todo processo de contratação de funcionários e no próprio funcionamento das duas unidades. “O sistema de OS deu certo em várias partes do país, como nos estados de São Paulo e de Goiás. O que precisa é que tenha participação do conselho nas decisões e no controle da atuação. Garanto toda transparência possível para o conselho e para a população, além do controle rigoroso da atuação da empresa vencedora com constantes auditorias”, frisou Samuca, que continuou:
“Com a OS vamos resolver um antigo problema da saúde de Volta Redonda, a contratação por RPAs (Recibo de Pessoas Autônomas). Os profissionais da saúde não tinham nenhum direito trabalhista. Agora, com a OS, eles terão carteira assinada, férias e folga renumerada”, disse Samuca, garantindo que vai levar todo o processo de contratação da OS para o Ministério Público Federal.
Nos próximos dias, Samuca Silva vai se reunir com todo o corpo técnico dos dois hospitais para explicar como será o novo sistema de gestão das unidades médicas. Afinal, a mudança deve atingir mais de três mil funcionários que hoje trabalham pelo sistema de RPA.
Idoso
Ao abordar a questão do Hospital do Idoso, Samuca lembrou que cerca de 40% dos atendimentos médicos de Volta Redonda são de moradores de fora da cidade do aço. E que a criação do Hospital do Idoso, que não atende emergências, foi para beneficiar os pacientes da terceira idade.
“Essa é a primeira unidade médica especificamente para o atendimento aos idosos acima de 60 anos do estado do Rio de Janeiro e o segundo em todo o país. A criação foi uma ideia conjunta dos técnicos do Ministério da Saúde com a prefeitura de Volta Redonda”, contou Samuca, adiantando que os pacientes são originários do Hospital do Retiro.
A situação do ainda fechado Hospital Santa Margarida foi abordada também por Samuca, que esclareceu as dúvidas dos conselheiros. A unidade será de porta fechada (sem emergência e urgência) e a previsão é que dois andares comecem a funcionar até dezembro de 2018.
Alfredo Peixoto, que também estava presente, disse que a aquisição do hospital foi um excelente negócio. “O inventário judicial mostra que há 24 máquinas de hemodiálise e outros dez leitos de UTI e diversos outros equipamentos de alto custo. Foi uma grande aquisição para a cidade”, frisou Alfredo. Que abram as portas, então!
Prefeito de Barra Mansa ainda tem dúvidas sobre OS do Hospital Regional
Na retaguarda
O prefeito de Barra Mansa, Rodrigo Drable, é escolado em OSs. Foi nas mãos dele que estourou a bomba deixada pelo antecessor, Jonas Marins, com a OS Geração Saúde, entre outras. Logo depois de tomar posse, Drable mandou romper o contrato com a Geração após receber diversas queixas de irregularidades e, principalmente, pelo atraso no pagamento dos salários dos funcionários da Saúde, que ficaram sem ver a cor do dinheiro em dezembro, incluindo o 13º. Coube a ele, como novo prefeito, pôr os salários em dia.
É por essas e outras que Rodrigo, assim como Samuca, desconfia um pouco da OS baiana contratada pelo governo do Estado para gerenciar o Hospital Regional. “O Ministério da Saúde aprova e recomenda o modelo de OS, mas vejo a fiscalização dos serviços como o ponto delicado para garantir o bom uso dos recursos e o melhor atendimento à população. O que mais me preocupa é a garantia de recursos para a manutenção do hospital, que não nos foi apresentada pelo governo do Estado”, disse o prefeito, ao ser provocado pelo aQui.
Tem mais. Rodrigo teme que aconteça com o Hospital Regional a mesma coisa que aconteceu com as Unidades de Pronto Atendimento 24 horas (UPA 24h), que viraram um abacaxi para os municípios, já que o Estado não tem dinheiro para manter as unidades. “Tenho receio de que aconteça como fizeram com as UPAs, pois os municípios não têm recursos para bancar sozinhos essa conta”, sentenciou.
Questionado sobre as intenções do prefeito Samuca Silva de colocar as OSs para gerenciar os dois hospitais municipais de Volta Redonda, Drable fez literalmente a política da boa vizinhança. “Sobre o prefeito de Volta Redonda colocar as OSs para gerenciar os hospitais municipais, acredito que o Samuca Silva é competente e fará as melhores escolhas para Volta Redonda”, disparou.