Por Mateus Gusmão
Antes do carnaval, os fluminenses saíram em bloco para comemorar a notícia de que o Tribunal de Justiça do Rio teria declarado inconstitucional (ilegal, grifo nosso) a cobrança da famosa ‘Taxa de Incêndio’. Quem comemorou celebrou à toa. Na segunda, 27, o próprio TJ esclareceu que a decisão é específica para um caso de Campos dos Goytacazes, envolvendo uma administradora de imóveis. Ou seja, a isenção só valeria para os imóveis mantidos pela empresa na terra de Garotinho.
A secretaria estadual de Defesa Civil, responsável pela manutenção do Corpo de Bombeiros, que não é boba e não quer ficar sem os valores da taxa, logo tratou de publicar uma nota lembrando que a cobrança seria, sim, absolutamente legal. O que vale dizer que, se a pasta estiver certa, o Rio, coitado, vai continuar sendo o único estado da região Sudeste a cobrar a famigerada taxa de incêndio.
O quiproquó começou em 16 de fevereiro, quando o TJ reconheceu, ao julgar um caso específico de Campos, que a cobrança da taxa de incêndio pelo Corpo de Bombeiros seria inconstitucional. O entendimento, segundo a desembargadora Leila Albuquerque, foi no sentido de que o serviço em questão deveria ser remunerado (mantido, grifo nosso) por impostos (e não por taxas). A decisão da 19a Câmara de Direito Privado, no entanto, só vale para as partes envolvidas nesse processo, que são a empresa Barcelos Netto e Filho Incorporadora e administradora de imóveis LTDA e o governo do Estado. Na ação, a Central da Dívida Ativa da Comarca de Campos dos Goytacazes atendeu o pedido da empresa para suspender a cobrança da taxa, o que foi contestado pelo governo.
Quando o TJ liberou a notícia sobre a ação de Campos, como não poderia deixar de ser, a população fluminense comemorou. Isso porque acreditava que a cobrança seria suspensa para todo mundo. Não foi. E o governo do Estado quis deixar claro que a população tem que pagar a ‘Taxa de Incêndio’. Em nota, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE-RJ) jura que a taxa cobrada é legal. Pior para os contribuintes: está em pleno vigor. “Cabe esclarecer que a taxa cobrada no estado é um tributo e, como tal, o pagamento é obrigatório. A cobrança da ‘Taxa de Incêndio’ foi considerada constitucional, por mais de uma vez, em 2021 e 2022, pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça, instância
maior do Judiciário fluminense que reúne os desembargadores”, completou a PGE. Tem mais. Procurou desmentir a informação de que o Supremo Tribunal Federal teria reconhecido como inconstitucional a taxa cobrada no estado do Rio. “A análise do STF foi feita sobre taxas instituídas por outros estados, com características distintas da taxa do Rio de Janeiro, e não afeta a legislação fluminense”, garante a PGE, tentando justificar a cobrança destacando que os recursos oriundos da cobrança da ‘Taxa de Incêndio’ são destinados ao reequipamento do Corpo de Bombeiros, nas áreas de salvamento e combate e prevenção de incêndio, proporcionando
maior proteção à população.
O ‘xis’ da questão é que há luz no fim
do túnel. A decisão do caso em Campos dos Goytacazes, por exemplo, pode servir de inspiração para que a população ingresse na Justiça contra a cobrança do tributo. Pelo menos é o que garante o professor de Direito Tributário da FGV, Gabriel Quintanilha. Segundo ele, os contribuintes ainda devem pagar a taxa que vence em março, pois o reconhecimento do TJ só afeta as partes envolvidas em Campos. No entanto, em entrevista ao jornal O Dia, ele destacou que a decisão pode abrir precedente para que outros possam entrar na Justiça. “Houve um equívoco do Tribunal de Justiça, que entendeu pela sua constitucionalidade. Neste caso mais recente, este equívoco foi reconhecido”, explica Quintanilha.
Segundo o especialista em Direito Tributário, o serviço de combate ao incêndio é um serviço genérico, assim como a segurança pública, e por isso não deveria existir a cobrança de qualquer taxa. “A taxa de incêndio é inconstitucional, porque é um serviço geral. A função dos bombeiros é combater incêndio onde quer que seja: em uma zona de mata, em uma propriedade pública ou privada. É um serviço prestado para toda a coletividade. Por isso, é inconstitucional a cobrança de taxa. Da mesma forma que, na Segurança Pública, se você sofrer um assalto, a polícia vai te atender”,explicou.
Enquanto não há uma solução definitiva, a população do Rio segue tendo que pagar anualmente a ‘Taxa de Incêndio’, que foi instituída em 1982. A de 2023 vence a partir do próximo dia 17. Os valores cobrados dependem do tamanho do imóvel. A mais barata, relativa a um imóvel residencial com 167 m2, sai por R$ 153,00. Éfogoounãoé?
