quinta-feira, março 28, 2024

Caos e medo

Mateus Gusmão

Os foliões que sonham em curtir o Carnaval nas ‘cidadezinhas’ de Minas Gerais ou em municípios onde existem casos suspeitos de febre amarela, têm até terça, 14, para serem vacinados se quiserem viajar sem se preocupar com o pior. É que a vacina só começa a fazer efeito, em média, dez dias após a sua aplicação, ou seja, ela só imunizaria a pessoa vacinada a partir do dia 24, sexta de Carnaval. Talvez seja por isso que, correndo contra o relógio, os foliões estejam indo à loucura para não ser obrigado a ficar em Volta Redonda e Barra Mansa, entre outras, sem poder aproveitar os quatro dias de Momo. O desespero pode ser sentido pelas confusões já verificadas nas filas dos postos de Saúde que não tem vacinas para atender a demanda e que vem aumentando com a procura, sem necessidade, de quem não vai viajar.

 

O aQui esteve na terça, 7, e na quinta, 9, na Unidade de Saúde Básica do Jardim Paraíba, único posto de Volta Redonda que aplica a vacina contra a Febre Amarela. Na terça, sem qualquer aviso prévio, a secretaria de Saúde liberou vacinas para 600 pessoas. Quatro vezes mais das 150 que seriam disponibilizadas naquele dia. Já na quinta, 9, foram disponibilizadas – também sem aviso – 750 vacinas. A quantidade, apesar de ser maior, não foi suficiente para atender a todos os voltarredondenses que procuraram a unidade.

 

O Palácio 17 de Julho, para evitar que filas fossem formadas durante as madrugadas, teve a boa ideia de alterar o horário de vacinação das 8 para as 17 horas. Não adiantou. Dona Maria de Lourdes da Costa, por exemplo, que quer ser imunizada para viajar para Mar de Espanha, na zona da mata mineira, ficou a ‘ver navios’. “Cheguei aqui às 19 horas de segunda (6). Achei que a vacinação seria às 8 horas de terça e só três pessoas estavam na minha frente”, comentou, ressaltando que não sabia que o horário havia sido alterado. “Eles nos informaram que a vacinação só seria a tarde e que entregariam senhas só no dia seguinte. Resolvi ir embora pra casa”, completou.

 

O problema é que dona Maria fez uma confusão: ela acreditou que, por ter ido a UBSF à noite, teria preferência para conseguir a senha no outro dia. Ledo engano. “Cheguei aqui na hora do almoço. Aí descobri que não teria preferência e ainda fiquei sabendo que vacinaram 300 pessoas pela manhã. Se eu soubesse disso tinha dormido na fila, é uma falta de respeito”, reclamou, ressaltando que não quer viajar para aproveitar o Carnaval. “Não estou querendo ir para a folia, preciso resolver alguns problemas pessoais lá. E tem muita gente na fila que nem viajar vai, eles tinham que dar prioridade para quem precisa viajar”, comentou.

 

Outros tiveram mais sorte. É o caso de Wendel Gomes, que foi vacinado na companhia da esposa Cristiane, e dos filhos Beatriz, 11, e Gabriel, 6. Eles foram os primeiros a serem vacinados às 17 horas de terça, 7. “Chegamos aqui às 10 horas. Já haviam vacinadas 300 pessoas. Na hora do almoço vacinaram mais 150. Mas como me falaram que teria mais 150 vacinas às 17 horas, eu fiquei esperando”, comentou Wendel. “No Carnaval, nós vamos para Luminárias ou Pedra Bonita, em Minas Gerais, ainda estamos decidindo. Se a gente não conseguisse vacinar, nós não iríamos, principalmente, por causa das crianças, né?!”, comentou.

 

Segundo Wendel foi difícil aguardar sete horas na fila. “O sol está muito forte. Eles (Poder Público) poderiam ter marcado um horário para distribuição de senhas e outro para a vacinação. Se tivessem me dado a senha na hora que cheguei, eu poderia ter levado as crianças para casa, elas teriam almoçado direito. Mas não, ficaram aqui o tempo todo comigo”, comentou. “Quando a gente chegou já O maior problema, entretanto, foi na distribuição das 150 senhas para a vacinação das 17 horas. Isso porque outras 200 pessoas ficaram sem senha. “Cheguei aqui na fila e contei, tinham 93 pessoas na minha frente. Como é que agora não vou ser vacinada? As pessoas estão vendendo lugar na fila, só pode. E outras chegam sozinhas, mas quando vai dando a hora da vacinação ligam para a família vir e entram na frente”, reclamava uma senhora para as funcionárias do posto de saúde. “A gente não pode fazer nada, vocês que tomem conta da fila”, respondeu uma das servidoras da unidade médica.

 

Passando-se por quem queria ser vacinado, o repórter do aQui questionou a funcionária sobre a distribuição da senhas. “Vou viajar para Minas e preciso vacinar, tem muita gente aqui que não vai. Como faz para ter prioridade?”, indagou. “Não tem jeito. Todo mundo aqui fala que vai viajar e eu não posso cobrar comprovante, passagem, nada disso”, destacou a funcionária. “A gente está esperando um novo lote de vacinas do Ministério da Saúde para tentar aumentar a quantidade de vacinação, mas não sabemos se vamos conseguir”, completou.

VR e BM pedem para moradores não viajarem

A secretaria de Saúde de Barra Mansa, através da coordenadoria do Setor de Imunização, enviou um release aos jornais para tentar tranquilizar a população local. Fez questão de frisar que a cidade não faz parte da área endêmica, ou seja, não estaria oferecendo risco de contaminação por Febre Amarela – assim como fez Volta Redonda. A coordenadora Marlene Fialho de Miranda explicou que a Febre Amarela urbana foi erradicada há mais de 50 anos. “Não estamos vivenciando um surto da doença. A vacina tem muitas precauções e contraindicações. As pessoas podem ficar tranquilas, porque Barra Mansa não está na área de risco”, jurou.

 

A vacinação contra a Febre Amarela em Barra Mansa está sendo realizada na secretaria de Saúde às terças e sextas, das 8 às 12 horas, por ordem de chegada, que é controlada por senha. Mas como não há vacinas para todos, a orientação é para que as pessoas não viajem para áreas de risco. “A orientação é para que as pessoas não viajem para áreas endêmicas como Minas Gerais e algumas cidades do estado de São Paulo. Por isso estamos orientando a vacinar apenas quem vai viajar. Essa vacinação deve ser feita dez dias antes da viagem. Outra dica de prevenção é o uso de repelente”, destacou a coordenadora do Setor de Imunização.

 

A mesma orientação – como o aQui mostrou na edição passada – foi dada pelo prefeito Samuca aos voltarredondenses. “Eu oriento a população para que procure a imunização apenas se for viajar para as áreas de risco. Segundo informações do Ministério da Saúde, não é preciso se vacinar nesse momento, pois não estamos no foco da Febre Amarela. Isso acaba atrapalhando quem vai viajar”, bradou o prefeito, ressaltando que não produz a vacina e, por isso, necessita do repasse do Ministério da Saúde.

 

Região entra em estado de alerta

Para piorar o pânico de voltarredondenses e barramansenses, várias cidades do Sul Fluminense entraram em estágio de alerta e agora tem áreas de vacinação obrigatória contra a febre amarela. Todas fazem divisa com Minas Gerais: Valença, Rio das Flores, Quatis, Itatiaia e Resende passaram a partir de terça, 7, a fazer parte da região com indicação para vacinação de bloqueio. A decisão foi da secretaria estadual de Saúde, com base na avaliação do cenário epidemiológico dos estados vizinhos. A medida, adotada de forma preventiva pelo secretário Luiz Antônio Teixeira Jr. visa criar um cinturão de imunização para tentar impedir a entrada do vírus no território fluminense.

 

Segundo Luiz Antônio, o objetivo é vacinar toda população das cidades que fazem divisa com Minas e Espírito Santo. “Estamos mobilizados para o acompanhamento constante do cenário epidemiológico, o que nos dá o dinamismo necessário para orientarmos nossa estratégia e ampliarmos nossa atuação. Em parceria com os municípios, estamos criando uma região de bloqueio, imunizando a população de todas as cidades que fazem divisa com MG, além de parte dos municípios próximos ao ES”, afirmou, ressaltando que seria pouco provável o vírus entrar em terras fluminenses. “Apesar de a entrada do vírus no RJ ser pouco provável, nosso papel, neste momento, é fazer o que podemos para proteger nossa população, de forma segura e responsável, fazendo o uso racional da vacina”, detalhou.

 

Com a nova resolução, a estratégia de bloqueio desenhada pelo governo do Estado amplia para 21 o total de municípios que devem ter sua população, parcial ou totalmente imunizada, observando as contraindicações. São eles: Cantagalo, Carmo, Comendador Levy Gasparian, Bom Jesus do Itabapoana, Laje do Muriaé, Miracema, Natividade, Porciúncula, Santo Antônio de Pádua, Varre-Sai, Rio das Flores, Quatis e Itatiaia. Além destes, Campos dos Goytacazes, São Francisco de Itabapoana, Itaperuna, Sapucaia, Três Rios, Paraíba do Sul, Resende e Valença.

 

Para Alexandre Chieppe, subsecretário estadual de Vigilância em Saúde, é fundamental que sejam vacinadas as pessoas que têm indicação. “Estamos acrescentando cinco aos 16 municípios que já contavam com a indicação para vacinação de bloqueio, totalizando 21 cidades dentro da nossa estratégia de criar um cinturão de imunização nas divisas com os estados de MG e ES, localidades onde nosso território está mais vulnerável nesse sentido. É essencial que a população siga as orientações dos profissionais de saúde e que sejam vacinadas as pessoas que têm indicação para isso”, reforçou.

 

Desde a última semana de janeiro, municípios de todo o estado estão tendo seus estoques reabastecidos, conforme a disponibilidade operacional e de armazenamento de cada um. Da primeira remessa de 350 mil doses disponibilizadas pelo Ministério da Saúde, 250 mil estão sendo destinadas à vacinação de bloqueio nos 16 municípios já orientados para a realização da campanha de bloqueio. Outras 100 mil doses foram entregues às demais prefeituras para reabastecimento dos estoques. Com a nova remessa de 350 mil doses disponibilizada, está sendo reforçado os estoques dos cinco municípios que passam a fazer parte da região de bloqueio, além de compor um estoque estratégico para reposição em todo o estado.

Tire suas dúvidas

Ainda há muitas dúvidas sobre a Febre Amarela e sobre quem deve se vacinar. Por isso, o governo do Estado, para tentar tirar dúvidas dos fluminenses, fez um questionário explicando tim-tim por tim-tim. Confira:

 

Quem são os moradores do estado do Rio de Janeiro que devem se vacinar?

Na terça, 7, a secretaria estadual de Saúde publicou uma resolução que inclui os municípios de Valença, Rio das Flores, Quatis, Itatiaia e Resende na estratégia de vacinação de bloqueio, dentro da estratégia adotada pela SES como medida preventiva. Além dos habitantes destas cinco cidades, os moradores dos 16 municípios que já contavam com a indicação a ação de bloqueio, com idades a partir dos 9 meses até os 60 anos, também devem se vacinar. Dentro deste público-alvo, é fundamental que sejam observadas as contraindicações da vacina.

Os municípios com indicação são: Cantagalo, Carmo, Comendador Levy Gasparian, Bom Jesus do Itabapoana, Laje do Muriaé, Miracema, Natividade, Porciúncula, Santo Antônio de Pádua, Varre-Sai, Rio das Flores, Quatis e Itatiaia. Além destes, os municípios de Campos dos Goytacazes, São Francisco de Itabapoana, Itaperuna, Sapucaia, Três Rios, Paraíba do  Sul, Resende e Valença terão regiões específicas para vacinação, não sendo recomendada a vacinação de toda a população destes cinco municípios.

 

Em que situação as pessoas que não moram nas regiões indicadas para a vacinação de bloqueio devem se vacinar?

Devem buscar os postos de saúde para a vacina as pessoas que estiverem com viagens programas para áreas do país com recomendação de vacinação, conforme as orientações do Ministério da Saúde, que disponibiliza as informações no site. Vale reforçar que é preciso tomar a vacina com pelo menos dez dias de antecedência. Não há qualquer recomendação para vacinação no restante do estado do RJ, até o momento, uma vez que não há evidências de circulação do vírus que transmite a Febre Amarela no estado – nem em humanos, nem em animais.

 

Qual é a orientação para quem já tomou a vacina?

A vacina garante a imunidade por dez anos, quando é preciso tomar uma nova dose. Após a segunda vacina, não há mais necessidade de uma nova dose. Novamente, é importante deixar claro que mesmo para a segunda dose, a recomendação é para que as pessoas que vivem em áreas com indicação da vacina não deixem de se imunizar. Para as demais regiões, prevalece a orientação de vacinar em caso de viagem programada para áreas de risco.

 

Qual é a orientação para quem perdeu o cartão de vacinação e não tem conhecimento da própria situação vacinal?

A recomendação é para que a pessoa procure o serviço de saúde que costuma frequentar para tentar resgatar seu histórico. Caso isso não seja possível, a pessoa deve iniciar o esquema vacinal normalmente. Para as pessoas com idades a partir de 5 anos que nunca foram vacinadas devem receber a primeira dose e um reforço, dez anos depois, sendo esta recomendação válida apenas para os habitantes que vivem em áreas com recomendação da vacina, presentes no calendário vacinal nacional do Ministério da Saúde.

 

Qual a probabilidade da entrada do vírus da febre amarela no estado do Rio de Janeiro?

Com base em avaliações dos cenários epidemiológicos, é possível afirmar que é pouco provável a entrada do vírus no território flumi-nense. A imunização da população que vive nas divisas com MG e ES é uma medida preventiva, uma vez que tais estados estão registrando casos da forma silvestre da doença. Com a vacinação de bloqueio, espera-se garantir a criação de um cinturão para tentar evitar a entrada do vírus em nosso território. No estado do Rio de Janeiro, não há registros de casos autóctones (transmitidos dentro do estado) nas últimas décadas. Portanto, o RJ não configura uma região endêmica para Febre Amarela.

 

O que é Febre Amarela?

Há dois tipos de Febre Amarela – silvestre e urbana. As duas são causadas pelo mesmo vírus e causam a mesma doença, mas se diferem pelo vetor de transmissão. A urbana é transmitida pelo Aedes aegypti e, de acordo com o Ministério da Saúde, desde os anos 40, o Brasil não registra casos deste tipo da doença. Já a silvestre é transmitida pelos mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabeths, insetos de hábitos estritamente silvestres. A Febre Amarela silvestre é endêmica em algumas regiões do país, principalmente na região amazônica. Os sinais e sintomas mais comuns da doença são: febre alta, calafrios, cansaço, dor de cabeça, dor muscular, náuseas e vômitos que duram, em média, três dias. Nas formas mais graves da doença, podem ocorrer icterícia (olhos e pele amarelados), insuficiências hepática e renal, manifestações hemorrágicas e cansaço intenso. Trata-se de uma doença infecciosa febril aguda, transmitida exclusivamente pela picada de mosquitos infectados.

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