No lugar da alegria, estresse. Em vez de música, gritaria. E o confete e a serpentina deram vez a bombas de gás lacrimogêneo, de pimenta e de efeito moral. Assim ficou marcada a passagem do ‘Bloco do Aterrado’ (nome não oficial) pela Avenida Oscar de Almeida Gama, na noite de domingo, 14. De acordo com o organizador do evento, um garoto de 17 anos, cuja identidade o aQui vai preservar, nem ele imaginava a proporção que aquilo tudo iria gerar. Testemunhas disseram, entre outras, que uma multidão tomou conta da avenida, impedindo a passagem de carros e pedestres. “Não sei de onde vieram. Tava vendo TV e de repente ouvi um barulho de tiros e gritaria. Muita gente correndo pela 7 de Setembro. Começaram várias brigas de gangues”, contou um morador, salientando que a maioria dos foliões era formada por adolescentes, que consumiam bebidas alcoólicas.
Incomodados com a passagem do bloco, que não tinha autorização da prefeitura para sair, moradores chamaram a Polícia e foi nesse instante que o caos se instaurou. Vídeos divulgados pelas redes sociais mostram um grande número de pessoas correndo em fuga pelas ruas do Aterrado, aos gritos. “Tiroteio e correria no Aterrado. Porra-daria, correria e barulho de tiro”, repetiu, impressionado, outro morador que testemunhou o ocorrido.
Conforme contou o adolescente que criou o bloco, nada disso era para ter acontecido. O que começou como uma conversa entre adolescentes no WhatsApp virou um pandemônio. “Tudo começou pelo zap. Estava conversando com um amigo meu sobre não termos nada para fazer no sábado (13). Aí tive a ideia de criar um ‘bloco’ pra nos tirar do tédio. Foi aí que começou: fiz o Bloco da Colina. Galera não parava de comentar. Era assunto em todas as redes sociais. O bloco ficou lotado. Não teve briga e rolou tudo numa boa”, contou o rapaz.
Ele explicou ainda que a ideia de levar o bloco para o Aterrado aconteceu durante o evento da pracinha da Colina. “Na mesma noite fiquei sabendo que tinham cancelado o bloco Galo Vermelho. Então pensei: ‘se aqui deu certo, e amanhã não tem nada, por que não fazer mais um amanhã (domingo, 14)? Então montei uma enquete perguntando onde queriam o próximo, ‘Colina parte 2’ ou Aterrado? A galera abraçou a ideia de fazer no Aterrado. Criei o novo flyer e marcamos para as 16 horas”, detalhou.
Ainda de acordo com o adolescente, em apenas 10 minutos o ‘Bloco do Aterrado’ já tinha ganhado as redes sociais. “Todos queriam ir e ainda chamavam mais gente”, disse, salientando que ficou impressionado com a multidão que conseguiu reunir pela internet. “No momento que cheguei lá (Aterrado), não acreditei que movi todo aquele pessoal para um simples bloco criado a partir de uma simples conversa entre dois amigos”, pontuou, contando que dado o número de pessoas presentes, chegou a pensar em organizar outros eventos até que o caos se instaurou, fazendo-o mudar de ideia. “Estava mais motivado a fazer blocos, até que toda a confusão começou. Aquelas bombas… o pessoal correndo… tudo parecia uma manifestação. Aí eu parei para pensar: ‘Meu Deus, o que eu fiz?’. No dia seguinte, cada vez mais reportagens sobre o dia anterior. A preocupação foi surgindo. Fiquei com medo de arrumar problema com as pessoas e com a Polícia. Nunca imaginei que daria essa reviravolta”, contou.
Questionado se sabia o motivo pelo qual os foliões foram dispersados com bombas, o adolescente explicou que alguns dos presentes arremessaram garrafas nas viaturas policiais. “Houve um conflito, um desentendimento. Ouvi que jogaram garrafas de bebida nos carros da Polícia. Mas não foi possível identificar quem fez isso. Foi tudo de repente. Quando me dei conta, já estavam todos correndo da bomba jogada pelos PMs. Até o momento ninguém sabe quem foram os baderneiros que provocaram isso”, argumentou.
O quiproquó carnavalesco atingiu até o dono do bar ‘Enjoados’, famoso no Aterrado por reunir centenas de jovens, principalmente nos finais de semana. Uma pessoa ligada ao estabelecimento, que pediu para não se identificar, contou que a Polícia exigiu que eles fechassem as portas do bar para facilitar a dispersão dos foliões. “Ninguém queria sair do bar. Foi só depois que fechamos que as pessoas começaram a ir embora”, revelou, lembrando que o dono, desta vez, não tinha nada a ver com o ocorrido. “Todos os anos o Enjoados reúne ‘a galera’ no carnaval. Era uma espécie de bloco. Mas como não cadastraram na prefeitura, ninguém se movimentou para puxar um encontro aqui. Talvez por isso, lá na enquete do rapaz que organizou este bloco, a maioria escolheu vir para o Aterrado”, crê.
À imprensa, o comandante da Guarda Municipal, Paulo Henrique Dalboni, disse que os foliões estariam consumindo bebidas alcoólicas. Garantiu ainda que o ‘Bloco do Aterrado’, que reuniu cerca de três mil jovens, não tinha autorização da prefeitura de Volta Redonda para percorrer as ruas do bairro. “Chegamos ao local por volta das 17 horas e levamos seis horas para dispersar os foliões. Não usamos nenhum tipo de força física, pois nossa intenção não era provocar tumulto”, detalhou Dalboni.
Sua informação é confirmada pelo organizador do bloco. “Acho que fizeram o trabalho deles de forma totalmente correta. Os participantes do bloco abusaram demais. Urinaram no portão das casas dos moradores. Tinha lixo por todos os lados”, concordou o jovem, avisando que pretende criar um bloco oficial e cadastrá-lo junto à prefeitura. “Não criei essa história toda para acabar por aqui. Ainda irei me regularizar, criar um nome de um bloco único e manter as tradições. Mas nada fora da lei, pois confusão como esta não pode mais acontecer de forma alguma”, argumenta.
É certo que o susto ensinou uma lição para o adolescente do ‘Bloco do Aterrado’, mas com a iminência do carnaval, outros blocos, autorizados ou não pela prefeitura, vão estourar pelas ruas de Volta Redonda e o “fim de festa” com tumulto, a exemplo do ocorrido na noite de domingo, na Oscar de Almeida Gama, acende o sinal de alerta para a segurança dos foliões e tranquilidade dos moradores.
A prefeitura, por exemplo, até tenta fazer a sua parte. Tanto que o prefeito Samuca Silva criou uma força tarefa, formada pela Polícia Militar, Guarda Municipal, Conselho Tutelar, Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e Coordenadoria Municipal de Prevenção às Drogas. O objetivo é único: coibir a apresentação de blocos sem autorização, além de garantir a segurança dos foliões e população. O grupo, inclusive, chegou a se deslocar para a Colina, no sábado, 13, ao ficar sabendo da movimentação do bloco criado pelo adolescente ouvido pelo aQui.
Ao aQui, o comandante da Guarda explicou que organizadores de blocos clandestinos estão sendo identificados, monitorados e chamados para prestar esclarecimentos na delegacia. “Alguns serão chamados para apresentar esclarecimento na delegacia de polícia, pois notamos não se tratar de blocos de carnaval e sim de aproveitadores vendendo bebidas alcoólicas para menores, o que é crime”, disparou, pedindo ajuda da população. “É preciso que os cidadãos denunciem na Ouvidoria, no portal VR ou no Ciosp. Precisamos entender que às vezes o Ciosp está envolvido em outras demandas, como roubo, acidentes, agressão a mulher, brigas, assassinatos. São inúmeros ‘izoporzinhos’ que se formam rapidamente por jovens, muitos cometendo infração, e precisando sempre da colaboração da sociedade para coibir essas infrações”, pontuou.