A voltarredondense Maria Aparecida é mãe de três filhos. A mais nova, de 11 anos, tem uma má-formação congênita que afeta os ossos da coluna e a medula espinhal, impedindo a menina de andar. Amparada pelas leis de inclusão, Kelly matriculou a filha na Escola Municipal Miguel Couto Filho, uma das mais conhecidas e respeitadas no que tange a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais. Lá, garante, não falta atenção e zelo por parte dos professores, mas os problemas, segundo ela, começam do lado de fora… bem no meio da rua.
Segundo Kelly, sem uma vaga destinada a deficientes na porta da escola onde possa estacionar para tirar a filha do carro, que depende de cadeira de rodas para se locomover, é um verdadeiro suplício. “Como não existe rampa ligando a rua à calçada da escola, eu preciso sair do carro, colocar a cadeira na calçada, depois pegar a minha filha esentá-la. Só então posso entrar na escola. Isso tudo, faço em local proibido. E pior do que isso é o fato de quase nunca encontrar lugar para parar na frente da escola. Já teve vezes que estacionei na rua atrás da escola e tive que dar a volta, empurrando a cadeira”, contou a mãe.
Ainda de acordo com Kelly, não é raro ela ter de estacionar no meio da rua. “Os outros pais, que vão de carro, ficam reclamando porque congestiona o trânsito. Mas é a única forma que encontro para levar minha filha à escola”, completou, afirmando que não tem nada a reclamar da Miguel Couto. “Eu amo a escola do portão pra dentro. Do portão para fora, é horrível”, disse.
Conforme o aQui apurou, a calçada de acesso à escola da aluna em questão não tem rampa, os banheiros não são adaptados e a unidade não possui corrimão para alunos com dificuldade de locomoção se apoiarem. Infelizmente essa é a realidade de pelo menos 35% das escolas de Volta Redonda. Neste pequeno universo, ou as escolas estão mal adaptadas ou não existe nada que posa auxiliar o aluno com deficiência física.
Segundo o pedagogo Maurício Ferreira, a acessibilidade é um fator essencial no processo de inclusão educacional. “O espaço e o ambiente escolar têm a capacidade de proporcionar e aproximar a comunicação e a convivência entre as pessoas. Sempre que se pergunta se algum local é acessível, geralmente a resposta é positiva baseada na existência de uma rampa, independente se está adequada ou não. A rampa se tornou um símbolo de acessibilidade física, assim como o banheiro adaptado. No entanto, a adequação dos espaços não se resume apenas a estes dois elementos”, explicou o professor.
“Pode-se definir acessibilidade como um conjunto de condições e possibilidades de alcance a todas as pessoas para a utilização com segurança e autonomia de espaços e edificações, sejam eles públicos ou privados. O mobiliário e os equipamentos devem proporcionar a maior autonomia, conforto e independência possível a todos e dar à pessoa com deficiência o direito de ir e vir a todos os locais da escola, de se comunicar livremente e participar de todas as atividades com o máximo de independência possível”, completou Maurício.
Ainda de acordo com o pedagogo, além da acessibilidade arquitetônica, é necessário prover a acessibilidade na sinalização e comunicação para facilitar toda a permanência do indivíduo com deficiência na escola, por exemplo o caso da mãe ouvida pela reportagem. “Neste caso, é necessário que o poder público ofereça equipamentos para favorecer o acesso (rampas, elevadores, veículos adaptados e vagas de estacionamento), facilitadores pedagógicos (brinquedos pedagógicos, pranchas de apoio, adaptações de mão para uso de lápis, tesoura, borracha, e os demais recursos e acessórios didáticos adaptados, englobando a comunicação, a compreensão e a resposta do aluno”, detalhou Márcio, ciente de que a realidade das escolas da região está bem longe do que prega a teoria. “Em suma, ainda há muito o que se fazer e se oferecer para que as escolas públicas possam, de fato, se intitular adaptadas”, concluiu.
O problema é que nem todos os governantes sabem disso. Ao ser questionada sobre quais escolas da rede municipal estariam precisando de adaptação, a assessoria de imprensa da prefeitura de Barra Mansa, por exemplo, garantiu veementemente à equipe de reportagem que todas (grifo nosso) correspondem às exigências da Associação Brasileira de Normas Técnicas. Independente do bairro, seja na periferia Leste ou no centro, o pai de algum aluno com deficiência física não encontraria problemas para se locomover nas escolas do município, garante a assessoria. Há quem garanta que não.
Já a prefeitura de Volta Redonda, em nota, garantiu que tem pretensão de adaptar 100% das escolas para atender os alunos com deficiência física. “Temos hoje, na Rede Municipal, um número significativo de escolas acessíveis, visto que mais de 65% das nossas Unidades Educacionais já sofreram adequação, 13% estão em obras ou em processo licitatório. Nosso planejamento prevê 100% de escolas acessíveis nos próximos anos”.
Ainda de acordo com a nota, a prefeitura possui um projeto para atender as demandas relacionadas à acessibilidade e já deu início às obras em 2017, com continuidade este ano nas seguintes escolas: Madre Tereza de Calcutá (concluído), Dr. Hilton Rocha, Acalanto, Espírito Santo, José Ferreira dos Santos, Raiozinho de Sol, Alzira Vargas do Amaral Peixoto, Cirandinha, Lions Club, Mato Grosso, Prof. Luiz Cantanhede, Roraima, Walmir de Freitas e Miguel Couto Filho, escola da personagem que ilustra essa reportagem.