Por Pollyanna Xavier
A concessão de licenças ambientais é uma medida importante para a regulação adequada de atividades que possam causar impacto ao meio ambiente, mas nem sempre as prefeituras acertam o tom. Em geral, acabam invadindo uma competência que não têm e autorizam uma atividade que deveria ser regulada exclusivamente pelo Estado. Na região, pelo menos dois casos recentes, um em Rio Claro e outro em Barra do Piraí, chamaram a atenção do Instituto Estadual do Ambiente, justamente porque as prefeituras concederam licenças que cabiam somente ao órgão fiscalizador estadual.
Os dois casos foram noticiados pelo aQui em julho. No primeiro, o de Rio Claro, a prefeitura local liberou uma licença de terraplanagem para a construção de uma pista para pousos e decolagens de pequenas aeronaves. A atividade acabou ultrapassando os limites da própria licença e a obra foi paralisada até que o dono do empreendimento – um empresário do Rio de Janeiro – regularize a situação. A licença municipal, claro, foi cassada pelo Inea, não apenas porque a autorização deste tipo de atividade compete ao Inea, mas principalmente porque a escavação do solo causou uma supressão na vegetação, muito além da permitida.
O flagrante foi captado pelo Satélite ‘Olho no Verde’, do Inea, que registrou o passivo e emitiu um alerta tanto ao município quanto à Superintendência do Inea na região. As obras foram embargadas e a licença municipal concedida pela prefeitura, cassada. Para ser ter uma ideia do tamanho do estrago, a supressão de vegetação nativa atingiu seis hectares, causando um impacto negativo no meio ambiente. Para piorar, funcionários da secretaria de Meio Ambiente e Agricultura de Rio Claro chegaram a afirmar ao aQui que cabia à prefeitura licenciar a obra, dispensando a intervenção do Estado. A afirmação, porém, estava errada e o próprio Inea garantiu que a atividade exigia licenciamento estadual, configurando uma clara invasão de competência por parte do município.
Outro caso mais recente é o de Barra do Piraí e envolveu a Metalúrgica MOR. A empresa, localizada no distrito de Dorândia, foi flagrada canalizando um corpo hídrico para a ampliação do seu parque industrial e estaria utilizando uma licença municipal para este fim. A legislação ambiental, entretanto, é clara ao garantir que intervenções que envolvem rios e lagos competem ao Estado ou a União, dificilmente ao município. No caso da Metalúrgica MOR, o próprio Inea reconheceu a invasão de competência, notificou a prefeitura e chegou a suspender todas as atividades da empresa, emitindo autos de embargos e de constatação.
Segundo apurado pelo aQui, ao receber a visita dos fiscais do Inea, representantes da empresa metalúrgica teriam apresentado uma licença emitida pela prefeitura de Barra do Piraí, configurando um excesso de poder (quando a autoridade ultrapassa os limites da sua competência legal). “Alguns municípios não estão tomando certos cuidados com a emissão de licenças ambientais e também estão extrapolando as competências nas emissões das mesmas, usurpando competências exclusivas do INEA”, comentou uma fonte ouvida pelo aQui, ligada ao Estado.
Para esclarecer a questão, a reportagem entrou em contato com o Inea-Rio, para saber como o órgão procede em casos em que há expressa invasão de competência. O aQui também quis saber se existem consequências jurídicas ou administrativas para a prefeitura ou se os técnicos municipais envolvidos no licenciamento irregular são responsabilizados. Além destes questionamentos, a reportagem também perguntou ao Inea se o Ministério Público estará sendo notificado em casos de invasão de competência ou se existe alguma cooperação técnica entre estado e municípios, para que um atue sobrepondo o outro.
De maneira bem clara, o Inea evitou polêmicas e não quis apontar quais municípios têm invadido sua competência. Em resposta ao aQui, o órgão ambiental estadual informou apenas que “oficia o ente competente para fiscalizar e penalizar os infratores, além do Ministério Público para ciência e adoção de providências”. Em caso de não adoção das medidas no prazo necessário, o Inea esclareceu que “atua no âmbito da fiscalização comum”. A pasta ambiental informou também que “não é de sua competência capacitar servidor municipal”, para atuar conforme a legislação, “fato que depende de política pública”.